Cenário global é de desaceleração e incerteza: confira recomendações de Stephan Kautz
Economista-chefe da EQI Investimentos comenta corte de juros nos EUA, manutenção da Selic em 15% e destaca oportunidades em renda variável e títulos atrelados à inflação
Na tradicional live mensal da EQI Research, realizada na quinta-feira (6) no canal da casa no YouTube, o economista-chefe da EQI Investimentos, Stephan Kautz, apresentou o panorama macroeconômico global e brasileiro que deve guiar os investimentos nas próximas semanas. O encontro, que acontece no início de cada mês, analisou o cenário de desaceleração econômica global, política monetária restritiva e movimentos políticos na América Latina.
Desaceleração global: Fed corta juros, mas sinaliza pausa
Nos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed) promoveu novo corte de 25 pontos-base, reduzindo as taxas para o intervalo entre 3,75% e 4%. A decisão, contudo, veio acompanhada de um discurso cauteloso do presidente Jerome Powell, que evitou sinalizar novos cortes à frente.
Segundo Kautz, a autoridade monetária norte-americana “preferiu não guiar o mercado em meio à neblina de incertezas”, especialmente diante do shutdown do governo americano, que suspendeu a divulgação de dados oficiais de atividade e emprego.
“É como dirigir com neblina: você tira o pé do acelerador. O Fed quer ver mais dados antes de decidir o próximo passo”, avaliou o economista.
A decisão surpreendeu parte do mercado, que precificava continuidade no ciclo de cortes em dezembro. Com o discurso mais duro, as taxas futuras subiram, refletindo a expectativa de pausa no afrouxamento monetário.
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Desaceleração na China e tensões comerciais
Kautz destacou ainda o papel da China no cenário global. A economia chinesa tem mostrado ritmo mais fraco, com PMIs industriais mais estáveis e de serviços neutros, e enfrenta limitações para reagir à guerra tarifária com os Estados Unidos. Apesar de avanços pontuais nas negociações, as tarifas médias sobre produtos chineses ainda superam 40%, após terem chegado a 50% no auge do conflito.
“Há um alívio, mas não uma solução. A economia doméstica chinesa segue fraca, e isso reduz o poder de barganha do país com os EUA”, resumiu.
O tema da inteligência artificial (IA) e uma possível bolha financeira também entrou na pauta, com Kautz citando a fala recente do CEO da Nvidia, que afirmou que a China pode já ter ultrapassado os EUA em IA — um ponto que o economista considera estratégico para a próxima década.
América Latina vira à direita
No bloco latino-americano, Kautz destacou o avanço de governos de direita e centro-direita em diversas nações. Na Argentina, a coalizão de Javier Milei consolidou maioria no Congresso, abrindo espaço para uma agenda de reformas e estabilização econômica.
“Milei deixa de ser um governo defensivo e passa a ter chance de implementar mudanças estruturais”, comentou.
O economista lembrou ainda da mudança política na Bolívia, com a vitória de Rodrigo Paz, após duas décadas de domínio da esquerda, e apontou tendência semelhante no Chile e na Colômbia, que também devem trocar de orientação política em breve.
“A América Latina como um todo caminha para um realinhamento à direita, o que tende a favorecer relações econômicas com os EUA”, afirmou.
No Brasil, entretanto, o cenário permanece incerto com as eleições de 2026 no horizonte. A certeza que se tem até aqui é que Luiz Inácio Lula da Silva será o candidato da esquerda – ele mesmo fez a afirmação recentemente, eliminando o nome de Fernando Haddad da corrida presidencial.
Copom mantém Selic em 15%, mas sinaliza conforto
No Brasil, o Comitê de Política Monetária (Copom) optou por manter a Selic em 15%, conforme esperado, mas o tom do comunicado trouxe nuances importantes. Kautz destacou que, pela primeira vez em meses, o Banco Central demonstrou maior confiança de que a taxa atual é suficiente para levar a inflação de volta à meta.
Os núcleos de inflação têm mostrado desaceleração — especialmente em bens industriais — e o mercado de trabalho começa a dar sinais de fraqueza, com aumento na taxa de desemprego e queda na ocupação informal.
“O BC começa a enxergar um cenário mais confortável. Nossa expectativa é que os cortes de juros comecem em janeiro, com uma redução de 50 pontos-base, levando a Selic a 12,5% até o final de 2026”, projetou o economista.
Kautz também chamou atenção para o agravamento do quadro fiscal: o déficit público já se aproxima de 8% do PIB, e a dívida líquida segue em níveis historicamente elevados.
“O governo arrecada muito, mas não consegue estabilizar as contas. Esse é um tema que só deve ser endereçado de fato em 2027”, alertou.
Mercado de crédito e desaceleração
O economista apontou piora no mercado de crédito, com queda nas concessões e alta na inadimplência, especialmente entre pessoas físicas.
“Quanto menos crédito cresce, menos estímulo a economia recebe. A desaceleração já é visível”, explicou.
Oportunidades de investimento
Apesar do ambiente desafiador, Kautz vê boas oportunidades em títulos indexados à inflação.
“Hoje faz mais sentido estar posicionado em ativos atrelados ao IPCA do que em prefixados ou pós-fixados”, disse.
Ele também reforçou a atratividade da bolsa brasileira, que recentemente rompeu os 150 mil pontos, mas ainda apresenta ações descontadas.
Nos fundos de investimento em infraestrutura (FI-Infras), Kautz destacou a importância de avaliar a qualidade do crédito, após um período de forte fechamento de spreads.
“Agora o mercado está mais saudável, mas ainda exige cautela”, comentou.
Dica de leitura
Encerrando a live, Kautz recomendou o livro “1929”, de Andrew Ross Sorkin, ainda sem tradução para o português. A obra, segundo o economista, oferece “um olhar humano sobre o crash americano de 1929, explorando as histórias dos personagens por trás da crise”.
“É uma leitura leve e instrutiva, que mostra como os sinais de alerta foram ignorados. Uma ótima reflexão sobre os ciclos de euforia e crise”, resumiu.
Clique no vídeo abaixo para assistir a live na íntegra: