Após a Guerra Fria, o mundo viveu um período de tranquilidade no cenário da geopolítica. Entretanto, a partir da segunda metade da década de 2010, a política internacional passou por algumas mudanças, incluindo a radicalização do discurso político em alguns países, a rivalidade entre Estados Unidos e China, o debate sobre a transição energética, as questões ambientais e, mais recentemente, a Guerra na Ucrânia.
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Diante de tantas transformações, o painel da Money Week “Como se Proteger dos Efeitos da Geopolítica” propõe uma reflexão sobre como a política internacional pode impactar sua carteira de investimentos.
Participaram deste painel Stephan Kautz, economista-chefe da EQI Asset; Oliver Stuenkel, analista político; e Luís Fernando Moran, head da EQI Research.
O novo cenário da geopolítica

Stephan Kautz dá início ao painel com uma análise sobre as mudanças no cenário geopolítico, incluindo a invasão russa à Ucrânia, a rivalidade entre Estados Unidos e China e a questão da transição energética. Diante disso, ele questiona Stuenkel sobre a relação entre o conflito entre Rússia e Ucrânia com a nova percepção da análise da política internacional.
O analista explicou que o mundo está entrando em uma nova fase, com uma tensão geopolítica ampliada por razões estruturais. Embora as pessoas tendam a personificar as decisões geopolíticas através de seus personagens, como Donald Trump, Joe Biden, Xi Jinping e Vladimir Putin, Stuenkel alerta que grande parte dos acontecimentos está mais relacionada a questões estruturais do que pessoais.
“Vivemos um período de relativa estabilidade geopolítica desde o fim da Guerra Fria, durante as décadas de 1990, 2000 e até metade da década de 2010. Foi um período caracterizado por uma única grande potência, o que minimizou o risco de conflitos entre as grandes potências, dado que havia apenas uma delas. Essa potência tinha uma orientação pró-globalização e buscava engajar outras potências em um sistema globalizado e aberto. Houve um consenso favorável à liberalização do comércio, que não prevalece mais nos dias atuais”, afirmou Stuenkel.
Stuenkel cita que o período atual é marcado pela multipolarização, isto é, existe a presença de várias potências no sistema. Em consequência, há um crescimento potencial para a geração de conflitos, uma vez que a China, Rússia e outras potências regionais buscam mais espaço de manobra sem depender da aprovação dos Estados Unidos, que já não possuem o mesmo peso econômico de antes.
Logo, o principal motivo por trás da invasão à Ucrânia não está diretamente ligado à personalidade de Putin. Para explicar a razão disso, Stuenkel promoveu a seguinte reflexão:
“Ela [a invasão russa] ocorreu no ano passado porque, pela primeira vez em décadas, a Rússia teve a oportunidade real de fazê-lo. Se a Rússia tivesse realizado tal ação há 20 anos, as sanções ocidentais teriam sido tão devastadoras que a economia russa teria entrado em colapso. Hoje, a Rússia pode contar mais com a China, que possui uma economia muito maior do que no passado, bem como com a Índia e o Brasil”, disse o analista político.
Nesse sentido, na avaliação de Stuenkel, o conflito reflete a nova realidade geopolítica, com a Rússia tentando recuperar o prestígio perdido após a Guerra Fria. Segundo ele, a intenção russa de incorporar parte do território ucraniano não é novidade para ninguém.
“Há anos viajo para a Rússia, e não é segredo que, em algum momento, o país pretendia retomar a Ucrânia. Agora, isso ocorre em função da nova realidade multipolar”, revelou.
Como resultado, a expectativa do conflito no leste europeu é que ele seja de longo prazo, uma vez que não há indícios de que Putin desistirá da Ucrânia, assim como os Estados Unidos e a Europa também não parecem dispostos a abandoná-la.
“O cenário mais provável é um conflito de muitos anos, com um risco leve de escalada”, alertou Stuenkel.
Dito isso, Stuenkel recomenda que os investidores precisam se adaptar a esse novo contexto, em que há um maior risco de tensões geopolíticas.
Moran pede cautela com o cenário atual

Moran concorda que é preciso adotar uma abordagem bastante cautelosa para não personificar demasiadamente o debate.
O head da EQI Research comentou que começou a trabalhar logo após a queda do Muro de Berlim. E diz que o mundo que se formou após esse evento moldou todas as opções de investimento que observamos atualmente.
De acordo com Moran, após a Guerra Fria, o Brasil se especializou em exportar commodities relativamente básicas, como minérios e produtos agrícolas.
“Podemos vivenciar momentos como o atual [de alta nas commodities], nos quais há um benefício temporário advindo disso [Guerra na Ucrânia]. Contudo, é essencial ser cauteloso ao tomar decisões de investimento a longo prazo, pois esse cenário pode mudar de forma dramática”, alerta Moran.
Dado esse cenário de commodities, o head da EQI Research relatou que isso o preocupa, uma vez que algumas commodities são mais estáveis e oferecem proteção, enquanto outras oscilam dramaticamente e são bem mais voláteis, o que as torna menos protegidas.
Portanto, é necessário adotar uma abordagem estratégica e cautelosa na tomada de decisões.
“Estamos no início de um ciclo, com queda das taxas de juros. É natural que ativos de risco, como a bolsa, estejam em ascensão. Contudo, este ciclo será diferente, já que será mais direcionado ao mercado interno do que ao externo. O mercado externo servirá mais como um hedge para um ciclo positivo interno, e vice-versa. Minha percepção segue nessa direção”, conclui Moran.
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