Os bancos regionais dos Estados Unidos voltaram a acender um sinal de alerta após novos indícios de aumento na inadimplência corporativa e deterioração de carteiras de crédito.
O movimento levou a uma onda de aversão ao risco em Wall Street na quinta-feira (16), pressionando ações do setor financeiro e reacendendo temores de contágio semelhante ao observado na crise do Silicon Valley Bank (SVB), em 2023.
Segundo a CNBC, a preocupação cresceu após dois bancos regionais americanos reportarem problemas com empréstimos corporativos, somando-se a uma série de casos de calotes que evoluem desde setembro. Entre eles estão as falências da First Brands, fabricante de autopeças, e da rede de concessionárias Tricolor Holdings.
Grandes instituições como Jefferies, UBS (UBS; UBSG34) e JPMorgan (JPM; JPMC34) tinham exposição a essas empresas, elevando o alerta para risco sistêmico.
“Quando você vê uma barata, provavelmente há mais”, disse Jamie Dimon, CEO do JPMorgan, durante teleconferência de resultados nesta semana, em referência à possibilidade de novos casos de crédito deteriorado aparecerem no sistema financeiro.
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Por que isso preocupa?
A alta da inadimplência não é vista como um evento isolado. Segundo fontes da CNBC, analistas alertam que a soma de juros altos por período prolongado nos EUA, desaceleração econômica em setores sensíveis ao crédito, falências corporativas mais frequentes e deterioração das carteiras dos bancos regionais pode refletir um estresse oculto no sistema bancário americano.
O temor é que o episódio evolua para algo maior, como já ocorreu em outros momentos históricos. Em 2008, a crise dos títulos hipotecários subprime começou com atrasos em financiamentos e rapidamente contaminou o mercado global. Já em 2023, o colapso do Silicon Valley Bank (SVB) mostrou como perdas em títulos e saques massivos podem destruir bancos médios em questão de dias.
Relembre: a crise do Silicon Valley Bank em 2023
O SVB ficou conhecido como “o banco das startups”, devido à forte atuação no mercado de venture capital. Com a disparada dos juros nos EUA, o banco perdeu liquidez, foi obrigado a vender títulos do Tesouro com prejuízo e tentou levantar capital no mercado – sem sucesso. O anúncio gerou pânico e uma corrida de US$ 42 bilhões em saques em 24 horas.
A instituição quebrou em 10 de março de 2023 e foi assumida pela FDIC, agência garantidora de depósitos americana. O caso derrubou também o Signature Bank e forçou o governo dos EUA a intervir rapidamente para evitar contágio sistêmico, garantindo os depósitos dos clientes e organizando a venda dos ativos. O episódio expôs uma fragilidade: bancos regionais americanos são mais sensíveis a choques econômicos do que grandes bancos globais.
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Qual o risco agora?
Embora o cenário atual não seja comparável ao de 2008, cresce o receio de que rombos de crédito corporativo comecem a se multiplicar. Segundo a CNBC, investidores monitoram atentamente empréstimos de alto risco, especialmente nas áreas de consumo, automotivo e mercado imobiliário comercial.
Além disso, os bancos regionais são responsáveis por quase 70% do crédito imobiliário comercial nos EUA – segmento que enfrenta aumento de vacância e queda no valor dos imóveis após a pandemia, devido ao trabalho remoto em grandes centros urbanos.
Pode virar crise global?
Especialistas afirmam que os riscos precisam ser monitorados, mas destacam diferenças importantes em relação a 2023:
Fator | Situação em 2023 (SVB) | Situação atual |
Motivo | Perda com títulos e corrida bancária | Inadimplência corporativa crescente |
Contágio | Risco imediato no sistema | Efeito gradual, rastreável |
Regulação | Intervenção rápida do Fed | Monitoramento mais rígido |
Risco sistêmico | Alto | Moderado, mas em evolução |
Ainda assim, investidores temem uma “crise silenciosa” de crédito se os defaults corporativos continuarem a subir.
Para Marink Martins, analista internacional da EQI Research, o movimento recente envolvendo os bancos regionais dos Estados Unidos não representa, até o momento, uma nova crise bancária como a do Silicon Valley Bank em 2023. Segundo ele, o que está acontecendo é reflexo de um mercado que entrou em uma fase de maior volatilidade e sensibilidade a qualquer sinal de risco.
“Estamos migrando de um slow market para um fast market, e isso ficou claro com a recente alta do VIX. O mercado está mais nervoso e reage de forma exagerada a notícias que reforçam a sensação de incerteza”, explica.
Marink destaca que os casos envolvendo bancos como Zions Bank e Western Alliance, citados nos últimos dias, não indicam por si só risco sistêmico.
“Não há indícios de um evento como o SVB neste momento. O que vemos é mais um pretexto para realização de lucros num mercado que já vinha desconfiado da própria força do rali de alta”, explicou o analista.
Ele observa ainda que os preços hoje estão influenciando as notícias – e não o contrário: “Há uma força gravitacional no mercado puxando os preços para testar novamente a média móvel de 50 dias do S&P 500. Isso está deixando os investidores inquietos, e qualquer notícia negativa vira gatilho para ajuste.”
Para ele, o foco agora não é um risco de contágio bancário, mas sim o comportamento do mercado em meio à temporada de balanços nos Estados Unidos. “Os fundamentos ainda não mostram um problema estrutural no sistema bancário americano. Mas o ambiente continua frágil e exige cautela.”