A tramitação do PL 1.087/2025 no Senado representa uma ruptura estrutural no modelo tributário brasileiro. A tributação dos dividendos é o eixo central da proposta e redefine a forma como o lucro empresarial será tratado a partir de 2026.
O texto, já aprovado pela Câmara, cria um Imposto de Renda Mínimo progressivo para rendas superiores a R$ 600 mil anuais e estabelece taxação de 10% na fonte sobre dividendos acima de R$ 50 mil por mês, pagos por uma mesma empresa a uma mesma pessoa física.
Na prática, o projeto recalibra a carga sobre o topo da pirâmide, afetando empresários, controladores de companhias e investidores de alta renda, que até hoje operavam sob um regime de isenção integral sobre lucros distribuídos.
“Essa reforma altera a lógica de distribuição de resultados no Brasil. O impacto não é apenas tributário — ele é estrutural. Muda a forma como o empresário decide o que é lucro e quando distribuir”, analisa Ricardo de Holanda, COO da ROIT.
Tributação dos dividendos: a janela de 2025
O texto mantém uma brecha estratégica: lucros apurados até 31 de dezembro de 2025 permanecem isentos, desde que a distribuição seja deliberada até essa data e siga o cronograma aprovado.
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A regra abre espaço para uma corrida por dividendos no próximo ano, especialmente entre empresas de capital fechado e holdings familiares.
“Essa é a última oportunidade de distribuir dividendos sem retenção. Mas o timing é crítico — antecipar mal pode custar caro”, alerta Holanda.
“O custo de endividamento e o impacto no capital de giro podem anular o ganho fiscal. É preciso planejamento técnico, não reação emocional”, complementa.
Segundo ele, 2025 será o ano do inventário de lucros.
Empresas precisarão revisar balanços, reclassificar reservas e mapear lucros acumulados com base em dados precisos.
A ROIT tem observado um salto na busca por soluções de automação fiscal e simulação preditiva, voltadas a planejar cenários tributários antes da virada de regime.
A nova regra: 10% na fonte e IR mínimo progressivo
Para a EQI Research, o modelo aprovado transforma radicalmente a relação entre empresa e acionista.
A nova tributação dos dividendos cria dois níveis de apuração — um no pagamento, outro na declaração anual — exigindo planejamento constante do investidor.
Além da retenção de 10% na fonte sobre dividendos acima de R$ 50 mil por mês, haverá um ajuste anual obrigatório — o chamado IRPF mínimo, que incidirá a partir de R$ 600 mil anuais, chegando a 10% para quem ultrapassar R$ 1,2 milhão por ano.
“Estamos entrando num sistema de dupla verificação: primeiro na empresa, depois na declaração anual. Isso exige acompanhamento constante de resultados e um nível de controle que o investidor brasileiro não está acostumado a ter”, explica João Neves, analista de renda fixa da EQI Research.
Caso a soma das alíquotas efetivas da pessoa física e da empresa ultrapasse o teto setorial de 34% a 45%, o contribuinte poderá recuperar o excedente.
Na prática, esse mecanismo aproxima o Brasil do padrão dos países desenvolvidos, mas adiciona camadas de complexidade à rotina contábil.
Empresas reagem: reestruturação de políticas de retorno
Com a tributação de dividendos em vista, o comportamento corporativo já começa a mudar.
Empresas listadas tendem a substituir parte dos dividendos por recompras de ações (buybacks), enquanto companhias de capital fechado deverão buscar modelos híbridos, combinando dividendos, juros sobre capital próprio e reinvestimento de lucros.
“Nosso mercado está se movendo para um modelo de remuneração mais racional. O lucro distribuído será planejado, não espontâneo”, observa João Zanott, analista da EQI Research.
Zanott avalia que 2025 deve registrar pico histórico de distribuições, seguido de retração expressiva em 2026, quando o novo IR entrar em vigor.
“Será um ano de concentração de dividendos e ajuste de portfólios — algo que o mercado ainda não precificou totalmente”, acrescenta.
Gestão fiscal e inteligência patrimonial como diferenciais
A alta renda brasileira — tradicionalmente pouco dependente de planejamento fiscal ativo — começa a se reposicionar.
Para a EQI Research, a reforma amplia a importância da gestão contábil integrada e do planejamento societário de longo prazo.
Empresas com governança fiscal robusta e previsibilidade de lucros devem preservar valuation e competitividade, enquanto estruturas pouco preparadas correm o risco de erosão patrimonial.
“O novo sistema premia quem tem estratégia e penaliza quem improvisa. 2025 é o ano de organizar a casa”, reforça Zanott.
A ROIT complementa:
“A contabilidade deixa de ser acessória e passa a ser central. O balanço se torna ferramenta de gestão de riqueza, não apenas de conformidade”, afirma Holanda.
A tendência é de recomposição dos portfólios, priorizando rendimento líquido e previsibilidade tributária.
“Com a distância entre ativos tributados e isentos maior, a escolha dos veículos de investimento vai ganhar peso estratégico. A gestão de portfólio passa a ser também uma gestão tributária”, explica Carolina Borges, head e analista de FIIs da EQI Research.
Ela ressalta que, embora o investidor sofisticado tenha acesso a instrumentos de compensação e diversificação, o impacto da reforma muda o cálculo de eficiência.
“O foco não será mais apenas o retorno nominal, mas o retorno líquido após imposto. Essa mudança de mentalidade é profunda”, conclui.
Do impacto fiscal à transformação cultural
Os especialistas apontam que o novo IR é mais que uma reforma fiscal — é uma mudança cultural na forma como o país entende lucro e patrimônio.
“O empresário brasileiro precisa sair da gestão reativa e adotar inteligência fiscal contínua. O que antes era uma preocupação de fim de exercício passa a ser um processo de tempo integral”, resume Holanda.
Para a EQI Research, o impacto de longo prazo será um mercado mais técnico, disciplinado e seletivo.
“A eficiência fiscal passa a ser ativo de valor. Com a tributação de dividendos, quem dominar esse novo regime não só preservará riqueza — vai liderar o próximo ciclo da economia brasileira”, conclui Zanott.