Naturalmente, me refiro ao risco de “R” de recessão nos EUA. Em um mundo onde as principais nações globais se encontram endividadas ao extremo, paira a pergunta: que país pode se dar ao luxo de entrar em recessão?
Veja que apresento tal fenômeno como uma escolha e não como algo inevitável. Afinal, aprendemos com Ben Bernanke em 2008 (“Quantitative Easing”), com Mário Draghi em 2012 (“Whatever it takes”) e com Powell em 2022 (colapso do Silicon Valley Bank) que qualquer crise neste mundo fiduciário que vivemos pode ser contra-atacada com expansão monetária. Há sempre o “FED at the ready!” (O Fed de prontidão!).
Risco de recessão: como fica o endividamento dos países?
Mas qual é a relação entre uma recessão e o endividamento dos países? O fato é que, em períodos de recessão, a receita tributária dos governos diminui drasticamente! E não é só isso. As empresas param de investir, e o consumidor, receoso em relação ao seu emprego, para de comprar. Portanto, a imposição de tarifas por Trump parece desafiar o bom senso econômico. Quais seriam as motivações do “cabeleira”?
A ideia de “onshoring” — trazer a produção de bens para os EUA — não é amplamente aceita. Na manhã desta segunda-feira (7), o analista da Wedbush Securities, Dan Ives, nos disse que, se o Iphone fosse produzido nos EUA, o preço do produto sairia por volta de US$ 3 mil dólares, ao invés dos US$ 999 cobrados atualmente.
É fato que os EUA não são competitivos do ponto de vista da manufatura neste momento. Para isso, eles precisariam de mão de obra barata e um dólar muito mais fraco. Mudar isso levaria tempo e seria extremamente perturbador no que diz respeito à NIIP americana (“Net International Investment Position” ou Posição Líquida dos Investimentos dos EUA — o saldo em dólares entre o que os EUA possuem de ativos no resto do mundo versus o que o resto do mundo possui de ativos nos EUA).
Sabe-se que a NIIP americana está negativa em US$ 26 trilhões — o que é um privilégio para os americanos, pois mostra a confiança que os investidores globais têm nos ativos norte-americanos.
E se a ideia do “onshoring” não convence, o que poderia justificar a atitude trumpiana? Se antes eu achava que Trump estava cometendo um tremendo equívoco ao criticar a posição negativa dos EUA em relação à NIIP, hoje (de forma menos arrogante) acho que Trump segue uma agenda que ainda está sendo mal compreendida pelos mercados.
Nesta busca por uma resposta, vale refletir a respeito da seguinte pergunta: nos EUA, que tema é capaz de unir democratas e republicanos? Uma das respostas a esta pergunta é o famoso “China bashing” (ataques à China).
Manobra populista de Trump?
Assim, arrisco dizer que há o risco de que Trump esteja embarcando em um populismo só visto na América Latina. Será que Trump poderá — mesmo que momentaneamente — deixar de lado os “10% mais ricos” em prol dos “50% mais pobres”? O rico tem ações, enquanto o mais pobre tem seu único imóvel como principal ativo. Os 10% mais ricos têm mais dinheiro, enquanto os 50% mais pobres têm mais votos. É possível que Trump já esteja focado nas eleições do “midterm” de 2026.
O analista da FundStrat, Tom Lee, em entrevista à CNBC, deixou claro que uma das razões para a derrocada vista nos preços dos ativos tem a ver com a ideia de que Trump “broke a core covenant of capitalism” (violou um dos pilares do capitalismo). Não há dúvida de que boa parte dos analistas e comentaristas de Wall Street está estupefata diante das ações de Trump, que parecem se afastar do bom senso econômico.
Considerando tudo isso, surge a questão: estaremos próximos ao fundo do mercado? Será que já é hora de comprar?
Apesar da queda dos últimos dias, o S&P 500 ainda acumula uma alta superior a 90% para aquele que começou a investir no ano de 2020 — ano da pandemia. É difícil responder à pergunta acima com base em uma análise fundamentalista. Afinal, ninguém sabe a respeito do impacto das tarifas sobre a lucratividade das empresas americanas. Em caso de recessão, é comum testemunharmos uma queda superior a 20% na lucratividade das empresas.
Dito isso, concluo este texto retomando o que disse no primeiro parágrafo: desta vez, a ocorrência ou não de uma recessão é uma escolha e não uma consequência da ciclicidade econômica.
Sendo assim, a decisão de comprar ou não neste momento deve levar em consideração uma compreensão das motivações por trás das decisões de Trump. Se você acha que tudo isso que está acontecendo é simplesmente um ruído com o objetivo de promover uma grande negociação em prol dos EUA, talvez seja uma ótima oportunidade de compra. Caso contrário — caso Trump queira de fato embarcar em um populismo latino-americano — talvez seja melhor ficar de fora.
Por Marink Martins, analista de investimentos internacionais EQI+
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