O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou na noite de segunda-feira (25) a demissão de Lisa Cook, integrante do Conselho de Governadores do Federal Reserve (Fed) e primeira mulher negra a ocupar o cargo. A medida, de legalidade contestada e sem precedentes na história recente da instituição, foi oficializada em carta publicada pelo próprio Trump em sua rede social, Truth Social.
Trump justificou a decisão com base em acusações de que Cook teria feito declarações falsas em pedidos de hipoteca, obtendo condições mais vantajosas em dois financiamentos ao alegar que ambos os imóveis eram sua residência principal. Segundo o presidente, essa conduta “demonstra negligência grave em transações financeiras e coloca em dúvida sua competência como reguladora”.
Cook, indicada ao Fed em 2022 pelo então presidente Joe Biden, rejeitou a decisão. “Não vou renunciar”, declarou em comunicado divulgado por meio de seu advogado, Abbe David Lowell.
“Continuarei a desempenhar minhas funções para ajudar a economia americana, como venho fazendo desde 2022.” O advogado acrescentou que “não há causa legal” para a demissão e que todas as medidas judiciais cabíveis serão tomadas.
Lisa Cook: Disputa jurídica à vista
A Constituição e o estatuto fundador do Fed preveem que membros do conselho só podem ser afastados “por justa causa”, mas especialistas questionam se as acusações levantadas contra Cook configuram base suficiente.
Em maio, a Suprema Corte já havia sinalizado que o presidente não pode demitir membros do Fed de forma arbitrária, decisão que deve servir de referência em um possível recurso.
O caso poderá, portanto, escalar para uma disputa judicial que definirá os limites do poder presidencial sobre a independência do banco central.
Acusações sem provas públicas
As alegações contra Cook foram levantadas por William “Bill” Pulte, diretor da Agência Federal de Financiamento da Habitação, indicado por Trump. Ele acusa a economista de fraude hipotecária, mas até o momento não apresentou provas públicas. O Departamento de Justiça confirmou que avalia o caso.
Cook, por sua vez, argumenta que os financiamentos foram contratados em 2021, antes de sua nomeação para o Fed, quando ainda era acadêmica, e que está reunindo documentos para esclarecer a situação.
Pressão sobre o Fed
A demissão de Cook ocorre em meio à campanha de Trump para remodelar a liderança do Federal Reserve e pressionar a instituição por cortes agressivos nas taxas de juros. O presidente já ameaçou em diversas ocasiões afastar o chairman do Fed, Jerome Powell — que só pode ser destituído por justa causa —, embora seu mandato como chefe da instituição expire em maio de 2026.
Nos últimos meses, o governo Trump tem intensificado ataques a políticas de diversidade e inclusão, o que já levou à saída de outras mulheres e representantes de minorias em diferentes órgãos públicos.
Com Cook fora do cargo — ainda que a validade da demissão seja contestada —, Trump pode acelerar a composição de uma diretoria mais alinhada aos seus interesses. Ele recentemente promoveu Michelle Bowman a principal reguladora bancária do Fed e cogita indicar Christopher Waller, também nomeado por ele, para suceder Powell no futuro.
Bowman e Waller foram os dois votos na última decisão de juros do Fed a votar a favor de uma redução de 25 pontos-base, contra a maioria que optou pela manutenção da taxa (atualmente no intervalo de 4,25%-4,50%).
Próximos passos
Enquanto Cook insiste em permanecer no posto até 2038, prazo de seu mandato, o imbróglio jurídico deve se intensificar. Caso a Suprema Corte seja acionada, a decisão poderá redefinir os limites da independência do banco central dos EUA em meio a uma das maiores tensões políticas entre a Casa Branca e o Fed nas últimas décadas.
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