O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, defendeu a manutenção da Selic, que atualmente está em 15%, em patamar restritivo por um período prolongado, durante palestra na Associação Comercial de São Paulo. Galípolo reforçou que a autoridade monetária “não tira o olho da bola” no cumprimento da meta de inflação.
“A única certeza que posso passar a vocês é que o BC não tira o olho da bola. Nossa meta é a meta de inflação”, afirmou o presidente, enfatizando que o Banco Central “não se desviará nem um milímetro da defesa da moeda e do valor da moeda do país”.
Desafio estrutural da geração atual
Galípolo organizou sua apresentação em três perspectivas temporais, começando por uma análise estrutural da economia brasileira. Segundo ele, o país viveu três fases distintas nos últimos 100 anos: a superação da dependência do café após 1929, o processo de industrialização entre 1930 e 1980 – quando o PIB crescia em média 7% ao ano – e o combate à hiperinflação com o Plano Real nos anos 1990.
O desafio atual, definido como “o desafio da nossa geração”, é responder por que o Brasil consegue sustentar taxas de juros elevadas em comparação internacional mantendo dinamismo econômico.
“Como é possível o Brasil sustentar taxas de juros que, quando comparadas com outros países, se revelam num patamar elevado, e ainda assim a economia apresentar o dinamismo que ela apresenta?”, questionou.
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Para exemplificar essa aparente contradição, Galípolo lembrou que o país registra hoje a menor taxa de desemprego da série histórica (5,8%), mesmo com juros em patamar restritivo. A solução, segundo ele, passa por “normalizar os canais de transmissão da política monetária” através de uma série de reformas estruturais.
Política fiscal e surpresas econômicas
Sobre o cenário externo, Galípolo analisou o impacto das políticas comerciais americanas, destacando uma mudança de percepção sobre o Brasil. Enquanto anteriormente a menor integração brasileira às cadeias produtivas norte-americanas era vista como desvantagem, agora é percebida como proteção contra possíveis tarifas.
O BC já incorporou em seu balanço de riscos os possíveis efeitos do “tarifaço” americano, que pode ter três impactos principais: aumento temporário da oferta interna de produtos, pressão cambial sobre a inflação e redução mais duradoura da atividade econômica. “Esse efeito não foi incorporado” ainda pelas projeções dos economistas, segundo pesquisas do próprio BC.
Expectativas desancoradas preocupam
Apesar de 90% dos economistas aprovarem as decisões recentes do BC – o que Galípolo considera fundamental para a credibilidade institucional – as expectativas de inflação de médio e longo prazo permanecem desancoradas.
“Observamos alguma alteração nas expectativas de inflação de curto prazo, mas as expectativas mais distantes continuam desancoradas, em um patamar bastante incômodo”, admitiu.
Por isso, o presidente reiterou a necessidade de manter juros restritivos por período prolongado, convivendo com maior incerteza.
“As ‘caudas’ estão mais ‘gordas’ no que se refere aos riscos – ou seja, houve um aumento da incerteza”, explicou, usando jargão técnico para indicar maior probabilidade de cenários extremos.
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O presidente do BC define como “o desafio da nossa geração” entender por que o Brasil consegue sustentar taxas de juros elevadas em comparação internacional e ainda assim manter dinamismo econômico. Hoje o país tem a menor taxa de desemprego da série histórica (5,8%) mesmo com juros em patamar restritivo. A solução passa por “normalizar os canais de transmissão da política monetária” através de reformas estruturais, diferentemente do Plano Real que teve uma “bala de prata” (a indexação).
Galípolo explica que a política fiscal com caráter mais progressivo e distributivo tem produzido maior impulso no crescimento do que o esperado. Ele compara as projeções dos economistas com “aplicativos de trânsito” que recalculam constantemente o tempo de chegada. Para o mesmo volume de gasto fiscal, o efeito sobre o PIB tem sido maior porque os recursos vão para camadas da população com maior propensão marginal a consumir, gerando mais atividade econômica.
O BC identifica três possíveis impactos do “tarifaço” americano: 1) Aumento temporário da oferta interna (produtos que não conseguem ser exportados); 2) Pressão cambial que pode afetar a inflação via pass-through; 3) Redução mais duradoura da atividade econômica pela perda de empregos e dificuldade de alguns setores encontrarem novos destinos para exportações. Paradoxalmente, a menor integração do Brasil às cadeias americanas, antes vista como desvantagem, agora é percebida como proteção.
Embora cerca de 90% dos economistas aprovem as decisões do BC (o que Galípolo considera fundamental para credibilidade), as expectativas de inflação de médio e longo prazo continuam desancoradas “em um patamar bastante incômodo”. Houve alguma melhora nas expectativas de curto prazo, mas o BC considera necessário manter juros restritivos por período prolongado até que as expectativas mais distantes convirjam para a meta.
Galípolo foi categórico: “A única certeza que posso passar a vocês é que o BC não tira o olho da bola. Nossa meta é a meta de inflação.” Ele enfatizou que o Banco Central “não se desviará nem um milímetro da defesa da moeda e do valor da moeda do país”, independentemente dos custos econômicos necessários. O BC reconhece que há maior incerteza no cenário atual (as “caudas estão mais gordas”), mas manterá o foco incondicional na meta estabelecida.