A EQI Research realizou, na noite de terça-feira (25), mais uma edição da série “Conversa de Investidor” no YouTube, com foco em renda variável internacional e estratégias de proteção em dólar.
A live “Não fique preso ao Brasil: como a renda variável internacional pode ampliar retorno e reduzir riscos” foi conduzida pelos assessores de investimentos Caio Dittrich e Bruno Zago, que defenderam a diversificação global como um dos principais antídotos contra a volatilidade doméstica e a perda de poder de compra do real ao longo do tempo.
Eleições, risco Brasil e por que ter uma “moeda forte” na carteira
Logo no início, Caio Dittrich lembrou que o Brasil entra em mais um ciclo eleitoral a partir do ano que vem, o que tende a aumentar a incerteza e a oscilação dos mercados locais. Nesse ambiente, concentrar todo o patrimônio em ativos brasileiros foi classificado como tudo, menos conservador.
“Muita gente se diz conservadora e tem basicamente todo o patrimônio localizado no Brasil. Fique sabendo que isso não é nem um pouco conservador, ainda mais com uma moeda que se desvaloriza recorrentemente”, afirmou Dittrich.
O assessor reforçou que boa parte do consumo cotidiano no país – de alimentos a combustíveis, passando por eletrônicos e carros – é sensível à variação do dólar, seja pela importação direta, seja pelo impacto nos custos logísticos. Por isso, a dolarização parcial da carteira foi apresentada como uma espécie de “seguro patrimonial” de longo prazo.
Fed dividido, shutdown e a importância dos juros americanos
Bruno Zago, que atua na área internacional da EQI com foco em renda variável, abriu o bloco macro explicando o cenário recente dos Estados Unidos. Ele destacou o shutdown mais longo da história americana, que paralisou agências federais e atrasou a divulgação de dados econômicos, deixando o Federal Reserve (Fed) “de mãos atadas” em parte de suas decisões.
Segundo Zago, o último ciclo de cortes de juros evidenciou um Fed dividido, com dirigentes defendendo velocidades diferentes de afrouxamento monetário – cenário que afeta diretamente ativos de risco no mundo todo.
“Quando a gente corta juros lá fora, isso beneficia a bolsa, setores como tecnologia e a economia como um todo. Ao mesmo tempo, aumenta o cuidado com a inflação, o que mostra como a política monetária americana continua central para o restante do mundo”, explicou o assessor.
Dittrich completou lembrando que, enquanto o Brasil ainda trabalha com juros elevados, o diferencial de taxas costuma atrair capital estrangeiro ao país. Porém, movimentos abruptos lá fora – como tarifas, mudanças regulatórias ou ruídos políticos nos EUA – podem mexer no câmbio brasileiro sem que o governo local mova uma peça.
Inteligência artificial, “bolha” e o papel da diversificação setorial
Um dos pontos que mais gerou dúvidas no chat da live foi o avanço da inteligência artificial (IA) e a percepção de que o rali recente das ações ligadas ao tema poderia caracterizar uma bolha.
Zago comparou o momento atual com a bolha das pontocom nos anos 2000, mostrando que, hoje, em empresas como Nvidia, o crescimento dos lucros acompanha o avanço de preço, ao contrário de casos emblemáticos da virada do milênio. Ainda assim, ele foi cauteloso:
“Existem argumentos dos dois lados. A gente vê lucros crescendo, mas também um ecossistema em que muitas empresas consomem umas às outras. Bolhas são, por definição, imprevisíveis. Por isso, o foco deve ser menos em adivinhar o topo e mais em montar um portfólio diversificado, com ativos de proteção”, pontuou Zago.
Na prática, os assessores defenderam combinar tecnologia e IA com setores mais defensivos, como finanças e saúde, além de manter caixa e instrumentos de proteção para aproveitar correções de mercado.
Tempo de mercado x “timing” e a força estrutural da bolsa americana
Outro conceito recorrente na live foi a diferença entre “tempo de mercado” e “timing de mercado”. Com base em estudos do S&P 500 entre 2000 e 2024, Zago mostrou que um investidor que permaneceu totalmente alocado teria transformado um aporte inicial de US$ 1.000 em cerca de US$ 70 mil, enquanto quem perdeu apenas os melhores dias de alta viu esse retorno cair pela metade.
“Os melhores dias da bolsa costumam vir logo após os piores. Quem tenta sair e entrar o tempo todo, guiado pelo medo ou pelo ‘fomo’, costuma perder justamente essas grandes pernadas de alta”, disse o assessor.
Os assessores resgataram ainda o histórico da bolsa americana desde a década de 1920, passando por guerras, crises de petróleo, booms e estouros de bolhas, pandemias e choques políticos. Em meio a tantos episódios, a mensagem foi que o mercado de ações dos EUA segue acumulando máximas ao longo das décadas, apoiado na resiliência da economia e no papel do dólar como principal moeda de reserva global.
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Mais empresas, mais inovação: o contraste entre B3 e Wall Street
Na comparação setorial, Zago chamou atenção para a diferença de dinamismo entre o mercado brasileiro e o americano. Ele lembrou que a B3 enfrenta um período prolongado com poucos IPOs, em parte por causa dos juros elevados, enquanto os Estados Unidos somaram mais de 1.600 aberturas de capital em um intervalo recente analisado na apresentação.
Dittrich reforçou que isso se traduz em mais oportunidades para o investidor internacional:
“Quando olhamos a composição da bolsa brasileira em 2001 e em 2024, vemos praticamente os mesmos nomes: bancos, estatais, grandes mineradoras. Já a fotografia da bolsa americana mudou completamente, com novas empresas e setores surgindo. Lá fora, é mais fácil atingir uma diversificação verdadeira.”
Os assessores também destacaram a dimensão do mercado global: empresas listadas no mundo somam cerca de US$ 100 trilhões em valor de mercado, dos quais aproximadamente 60% estão concentrados nos Estados Unidos. O Brasil, por sua vez, não chega a 1 trilhão de dólares.
Home bias, dólar como “seguro” e recomendação de exposição
Um dos trechos mais didáticos da live abordou o chamado home bias – a tendência de o investidor aplicar majoritariamente naquilo que conhece, normalmente o próprio país. Para ilustrar o impacto disso, Dittrich lembrou que, desde o Plano Real, o poder de compra da moeda brasileira se deteriorou mais de 80%, enquanto o dólar se manteve como referência global em transações e reservas.
Zago citou ainda dados de outros países: em média, chilenos alocam mais da metade do patrimônio fora do Chile, enquanto até mesmo investidores americanos – que vivem na maior e mais líquida economia do planeta – mantêm cerca de 25% aplicados no exterior.
“Dólar, hoje, é seguro de patrimônio. A pergunta que o investidor precisa se fazer é simples: quantos por cento do meu patrimônio eu quero dolarizar? Não é sobre abandonar o Brasil, mas sobre não ficar preso a ele”, resumiu Zago.
Como referência geral, os assessores mencionaram que uma faixa entre 15% e 30% do portfólio em ativos atrelados ao dólar tende a ser um ponto de partida razoável, a ser ajustado conforme perfil de risco, objetivos e prazo de cada investidor. A recomendação, porém, foi sempre buscar acompanhamento profissional para dimensionar essa fatia.
Aportes constantes e a metáfora do “seguro de carro”
Em relação ao “melhor momento” para comprar dólar, a mensagem foi clara: tentar acertar o fundo da cotação é tão improdutivo quanto tentar prever o dia exato de uma forte alta na bolsa.
“O dólar desce de escada e sobe de elevador. Se o investidor ficar esperando o preço perfeito, tende a perder as melhores oportunidades. Seguro de carro você não contrata quando o carro já está derrapando; com o patrimônio é a mesma lógica”, afirmou Dittrich.
Por isso, ambos defenderam a estratégia de aportes constantes, em menores valores, para construir aos poucos uma posição em moeda forte e diluir o risco de entrada.
“Nunca aposte contra os Estados Unidos”
Na parte final, Zago citou a famosa frase de Warren Buffett – “never bet against America” – para sintetizar a visão de longo prazo da EQI em relação ao mercado americano. Ele lembrou que muitas das maiores empresas do mundo foram fundadas por imigrantes ou filhos de imigrantes, o que reforça a capacidade de atração de talentos, inovação e capital dos Estados Unidos.
Encerrando a live, Dittrich reforçou o recado principal da noite:
“A ideia não é abandonar os investimentos no Brasil, mas participar também da festa lá fora. Ter parte do patrimônio em dólar, exposta a empresas globais e setores de crescimento, é deixar de jogar só em campo doméstico e começar a construir uma carteira realmente global.”
A live permanece disponível no canal da EQI Research no YouTube e marcou a penúltima edição do ano da série “Conversa de Investidor”, que volta à programação em dezembro com um encontro especial de encerramento.
Veja a live na íntegra:





