O cenário de investimentos no Brasil tem passado por uma transformação significativa, refletindo a busca crescente por oportunidades de diversificação de portfólio e rendimentos fora dos tradicionais instrumentos financeiros. É nesse panorama que entram os investimentos alternativos: aplicações que tendem a ter menor liquidez e maior risco, mas também maior potencial de ganhos.
Em geral, investimentos alternativos são veículos que investem em ativos não tradicionais, como infraestrutura, imóveis, dívidas, capitais privados.
Durante o EQI Asset Day, realizado na quarta-feira (6), os gestores Leonardo Barbosa, Olivier Colas e Felipe Schucman falaram com Ettore Marchetti, CEO da EQI Asset, sobre este cenário no Brasil e o que esperar para 2024, em um contexto de afrouxamento da política monetária e com a reforma tributária em andamento. Acompanhe.
“Special situations” e precatórios
Leonardo Barbosa, sócio e cofundador da Score Capital, explica o que é considerado uma “special situation”, do termo em inglês que significa “situação especial”. O que define esses investimentos alternativos, na verdade, depende do contexto.
“Por exemplo, o segmento de real estate, imobiliário, pode se encaixar a depender do player. Há casas olhando para carteiras de crédito imobiliário não performadas para recuperação do ativo, projetos envolvendo a compra de imóveis em leilão judicial, entre outros”, esclarece.
Geralmente, esse tipo de investimento é de alto risco – assim como seu potencial de retorno. Cabe ao investidor compreender quando vale a pena ou não assumir a volatilidade.
Há dois grandes pilares em special situations, explica Barbosa: sempre envolve uma necessidade urgente e imediata de caixa pela empresa ou pelo vendedor do ativo; e se situa em um cenário que requer uma complexidade de estruturação e conhecimento do gestor para poder navegar neste território.
“Vemos diversos ativos de longuíssimo prazo, de oito a 12 anos, nesse tipo de investimento, o que gostamos bastante. É um mercado interessante e em desenvolvimento, que ainda tem muitos avanços no caminho no Brasil, diferentemente dos Estados Unidos e Europa, que já têm esse panorama mais avançado.”
A especialidade da Score Capital é em ativos judiciais, precatórios e crédito, sempre com lastro em garantia. Os precatórios são títulos de uma dívida do governo como resultado de uma condenação judicial adversa.
O modo de encarar esse tipo de ativo mudou a partir de 2021, elucida o gestor, com a PEC dos Precatórios. Até aquele ano, o mercado de precatórios federais era estável. O título era emitido e, no ano seguinte, orçado e pago. Historicamente, os passivos ficavam em torno de R$ 30 bilhões a R$ 40 bilhões anualmente.
“Em 2021, o aumento foi expressivo, para a casa dos R$ 80 bilhões. As derrotas do governo geraram a pressão e o crescimento do estoque de precatórios federais. Um segundo grande evento foi a pandemia, que gerou a necessidade de um orçamento para saúde e programas de assistência social. Com isso, surgiu a PEC dos Precatórios, que criou uma espécie de teto – um limite de gastos anuais para o governo pagar esses títulos. A consequência é que gerou um volume maior de precatórios não pagos a partir de 2022, em torno de R$ 95 bilhões, além dos emitidos hoje”, explica.
Na última semana, o STF decidiu eliminar o limite do pagamento de precatórios, então o governo agora está liberado para retomar os custos. Com isso, as gestoras que alocam nesses títulos voltam agora a olhar para os papéis com maior otimismo.
“Para quem é dono de um precatório federal, há mais visibilidade e certeza sobre os títulos. Para os gestores, a precificação, previsibilidade e certeza passam a aumentar também. Do lado do governo também é positivo, pois respeita as instituições, as decisões jurídicas e honra e reconhece a dívida pública”, avalia o gestor.

Desenvolvimento imobiliário
A FL2, gestora de recursos especializada em investimentos imobiliários, se coloca como uma empresa operacional, que desenvolve o ativo da ponta.
Felipe Schucman, sócio-diretor da FL2 Partners, diz que a gestora olha para dois tipos de fundos: os que geram dividendos e têm algum tipo de liquidez, e outros que gerarão ganho de capital no futuro.
“Apesar de termos uma boa liquidez no Brasil para fundos que geram renda mensal, que com a queda de juros terão mais vantagem, temos visto boas oportunidades em fundos de desenvolvimento e incorporação”, pontua.
Na visão do especialista, esses mercados sentem rapidamente os efeitos e otimismo futuro da queda de juros, que já está precificada. “Este é um momento de parcerias em boas praças, com bons parceiros, que ainda estão vendo um mercado com juros altos e maiores dificuldades de se financiar, além de haver ativos bem precificados e oportunidade de surfar essa curva de ganho de capital.”
A maior parte do fundo que a FL2 tem planejado para o próximo ano é de desenvolvimento imobiliário, principalmente residenciais. O mercado é bem consolidado no Brasil, e até pouco tempo atrás não era aberto a pessoas físicas.
Agronegócio
Em 2022, o agronegócio contribuiu em 3 pontos percentuais no PIB do Brasil. O setor é a grande locomotiva da economia brasileira, com competitividade mundial, que sobrevive a qualquer choque. É o que diz Olivier Colas, co-head de Agro da EQI Asset.
“O agro é um setor muito tecnificado. O mundo precisará, daqui para frente, cada vez mais de comida – algo que não virá de expansão geográfica, mas sim de melhorias de produtividade. Produtividade é investimento: irrigação, mudança do tipo de fertilizantes (que o Brasil ainda depende de 85% de importados), etc”, pontua.
Colas vê a reforma tributária como um evento de grande impacto para o agronegócio. Isso porque o Brasil costuma exportar produtos sem valor agregado. “Cerca de 80% da soja exportada é em grãos, não em farelos. Na Argentina isso já é ao contrário. Há algo fundamentalmente errado. A logística também deve ser grandemente beneficiada, uma vez que o produtor brasileiro, para exportar, deve ajustar seus preços às condições do exterior, dos EUA.”
O cenário do agronegócio também depende grandemente do produtor. Ele entra em uma nova tecnologia, faz uma aposta que não sabe se vai dar certo – e é aí que o gestor pode ter um papel essencial, ao lado dos investidores.
“Podemos ajudar esse produtor com o salto tecnológico. Ao montar um fundo de investimento, você insere sua filosofia. Acredito muito que podemos continuar nessa jornada de diferenciação pelo resto do mundo ao fazer esses investimentos em particular em tudo que promove o salto tecnológico”, diz.