Em sua já tradicional live mensal promovida pela EQI Research, o economista-chefe da EQI Asset, Stephan Kautz, apresentou suas projeções para o cenário econômico global e brasileiro, com foco em juros, inflação, atividade e investimentos. A transmissão ocorreu em meio a um contexto de maior incerteza internacional e de sinais de desaceleração da atividade no Brasil.
Perspectivas macroeconômicas: Fed deve cortar juros mesmo com inflação em alta
“É incomum ver o Fed cortando juros enquanto a inflação está subindo. Isso gera dúvidas sobre a influência política do governo Trump na condução da política monetária americana”, avaliou.
Kautz citou a possível entrada de novos diretores alinhados a Trump no board do Fed, o que pode reforçar uma postura mais “dovish” (flexível). Essa tendência contribui para um dólar globalmente mais fraco, motivo pelo qual a EQI revisou a projeção de câmbio para R$ 5,45 no fim de 2025.
Europa, China e EUA
Europa: Para Kautz, a Europa vem surpreendendo positivamente, afastando o risco de recessão.
EUA: Consumo e investimento mostram sinais de desaceleração, mas sem sinal de recessão.
China: Dados recentes de varejo e indústria decepcionaram, reforçando expectativa de novos estímulos no segundo semestre.
Impactos no Brasil: real mais forte e inflação menor
O real mais valorizado levou a EQI Asset a revisar suas projeções de inflação:
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2025: de 5,30% para 5,10%;
2026: de 4,40% para 4,20%.
A Selic, segundo Kautz, deve permanecer em 15% até o fim de 2025 e cair para 13% em 2026, com início do ciclo de cortes previsto para o primeiro trimestre do próximo ano.
“Ainda estamos com inflação a 4%, longe da meta de 3%. A inflação de serviços roda acima de 6% e deve encerrar 2026 em torno de 4,5% a 5%. Por isso a manutenção dos juros”, destacou.
Kautz apontou que a economia brasileira mostra perda de fôlego:
Indústria: estagnada, sustentada apenas por mineração e petróleo.
Varejo: em desaceleração.
Serviços: único setor com expansão mais consistente.
No mercado de crédito, há aumento da inadimplência, mesmo considerando o efeito de mudanças regulatórias do Banco Central. Além disso, a expansão do crédito — antes motor relevante da economia — perdeu força e hoje é neutra para o crescimento.
“Atividade e inflação estão desacelerando no Brasil, mas a inflação está em 4%, enquanto a meta é 3%. A inflação de serviços ainda roda em patamar alto, mais que o dobro da meta, em 6%. Ela demora mais para desacelerar.”
Fiscal e política: gastos sociais pressionam contas públicas
O resultado primário voltou ao déficit, em torno de 0,3% do PIB, e pode encerrar o ano negativo em até 0,6%.
Do lado das despesas, chamam atenção:
Bolsa Família: hoje em torno de R$ 150 bilhões anuais (três vezes mais que antes da pandemia).
BPC: já próximo de R$ 120 bilhões, quase igualando o Bolsa Família.
Somados, esses dois programas respondem por cerca de R$ 300 bilhões ao ano.
Popularidade presidencial e mercado
As pesquisas mais recentes mostram queda na aprovação do presidente Lula, após breve melhora.
“A aprovação tinha melhorado por conta das tarifas do Trump, quando aumentou um pouco mais o sentimento de nacionalismo e patriotismo. Mas, na última pesquisa, voltou a abrir a diferença: a desaprovação teve alta e a aprovação teve queda. É importante porque a gente tem olhado esse gráfico com bastante atenção para ver a probabilidade de reeleição”, afirmou Kautz.
Segundo ele, os cálculos indicam que uma reeleição depende de o presidente ter uma rejeição abaixo de 40%.
“Se houver desaceleração da aprovação, a chance de reeleição cai. O mercado reagiu bem a essa pesquisa. Seguimos ainda sem ter preço das eleições nos ativos, mas o mercado deve ficar mais sensível daqui para a frente”, apontou.
Lei Magnitsky: pode afetar bancos brasileiros?
O tema gerou dúvidas no público, e Kautz foi categórico:
“Eu ficaria tranquilo de falar que não deve ter nenhuma medida mais dura em relação aos bancos e ao sistema financeiro brasileiro, que não vai ser obrigado a não operar ou ser excluído no mercado americano. Não vejo risco. A lei Magnitsky não é sobre instituições, é sobre pessoas. Mais ministros podem ser incluídos nessa lei. Mas os brasileiros em geral não vão ter restrição. O nosso dinheiro, nossos investimentos, tudo o que estiver em bancos aqui e lá fora não vai ter restrição, a não ser que você seja afetado pela lei”.
Ele citou ainda o caso da Rússia como exemplo extremo de sanções:
“Lá, pessoas foram incluídas na lei, e os bancos russos só foram excluídos do Swift após a invasão da Ucrânia — e mesmo assim todos continuaram usando os bancos normalmente. Então, novamente, a lei Magnitsky é para pessoas e indivíduos sancionados pelo governo americano. A gente ser excluído do Swift é praticamente impossível”, enfatiza.
Onde investir com estas perspectivas macroeconômicas?
Kautz também apresentou recomendações de investimento diante do cenário atual:
Renda fixa: preferência pelos títulos prefixados.
Diversificação global: buscar oportunidades fora dos EUA, com destaque para a Europa.
Exterior: diversificar também nos EUA, mas olhando para prazos mais curtos, devido às incertezas ligadas às intervenções do Fed.
Ouro: pode ser interessante para diversificação, principalmente no cenário de possível fraqueza do dólar.
Bolsa brasileira: segue atrativa, mas exige cautela.
“A gente continua vendo diversos ativos bastante atrativos e baratos na bolsa brasileira, com boas oportunidades para quem quiser investir em renda variável. E você pode não comprar ação direto, mas entrar via fundos imobiliários ou ETFs (Exchange Traded Funds) de dividendos. É uma forma de participar do mercado com mais proteção. Temos inclusive carteira de dividendos preparadas pela nossa equipe de Research (disponível neste link)”
Dica de leitura: House of Huawei
No encerramento da live, Kautz recomendou o livro “House of Huawei”, da jornalista Eva Dou.
“É a história de uma das maiores empresas do mundo de telecomunicação, que construiu praticamente toda a estrutura de 5G da Europa e do Brasil. A Huawei cresceu na China do nada e em duas décadas se transformou numa das maiores fornecedoras globais. A jornalista investiga todo o passado da empresa e mostra muito da história da China, como o governo testava experimentos econômicos em determinadas regiões, como atuou em mercados que as grandes teles não queriam e como a Huawei entrou em embates com as maiores empresas de telecomunicação do mundo. É a história secreta de uma das empresas mais poderosas da China.”