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IOF e turbulência no mercado: especialistas apontam retrocesso e falha de comunicação

IOF e turbulência no mercado: especialistas apontam retrocesso e falha de comunicação

O anúncio feito nesta quinta-feira (22) pelo governo federal de uma série de mudanças no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) causou forte repercussão no mercado financeiro. As alterações, que passam a valer imediatamente, incluem a unificação da alíquota em 3,5% para diversas operações cambiais. Segundo o Ministério da Fazenda, a medida visa eliminar distorções, harmonizar o sistema e reduzir a volatilidade cambial. A previsão é de uma arrecadação extra de R$ 20,5 bilhões em 2025 e R$ 41 bilhões em 2026.

Apesar do discurso oficial, a reação do mercado foi negativa — e contundente. Para os especialistas da EQI Investimentos, a decisão representou um retrocesso na agenda de inserção do Brasil no mercado internacional, além de evidenciar falhas graves na comunicação do governo com os agentes econômicos.

No final da noite de quinta, o governo anunciou, via redes sociais, que estava voltando atrás na mudança do IOF para dois importantes canais de investimento no exterior. As aplicações de fundos nacionais fora do país continuarão isentas de IOF, e as remessas feitas por pessoas físicas com finalidade de investimento seguirão com a alíquota reduzida de 1,1% por operação.

Imposto sobre Operações Financeiras (IOF): “Passo atrás político e técnico”

Alexandre Viotto, head de Banking da EQI Investimentos, criticou duramente a mudança sob a ótica macroeconômica e institucional.

“Do ponto de vista político, o Brasil deu um passo atrás ontem. No momento em que o país tenta entrar na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e criar regras mais claras para investidores estrangeiros, a medida vai na contramão”, afirmou.

Viotto também apontou a má condução do anúncio:

“A comunicação foi péssima. Houve vazamento de informações e notícias de que nem mesmo Gabriel Galípolo (diretor do Banco Central) havia sido consultado previamente. Além disso, o governo voltou atrás em pontos sensíveis para a indústria de fundos e investimentos no exterior, o que reforça a instabilidade regulatória.”

imagem do Instagram do Ministério da Fazenda, com anúncio sobre IOF
Reprodução: Instagram/Ministério da Fazenda

Para as pessoas jurídicas, segundo ele, o cenário é ainda mais preocupante.

“Tomar um empréstimo agora pode custar quase 4% só em IOF. Isso desincentiva o investimento produtivo e deve, na prática, ser repassado aos preços — gerando efeito contrário ao desejado, que seria o controle da inflação e queda dos juros.”

O especialista também destacou que a ausência de qualquer período de carência prejudicou quem já estava com operações cambiais em curso.

“Clientes que operavam D+0 ou D+2 foram pegos de surpresa. Hoje, o dia na mesa será para avisar clientes que o IOF incidirá sobre operações que estavam em andamento.”

Thiago Freire: impacto imediato, mas com chance de reversão

Para Thiago Freire, analista de produtos da EQI Investimentos, a reação negativa dos mercados foi intensa, mas não chega a ser uma surpresa.

“A alta do IOF serviu como gatilho para acelerar um movimento de realização de lucros que já estava em andamento. O pano de fundo disso é bem claro: ao longo do ano, o diferencial de juros favorável ao Brasil sustentou o real e os ativos locais. Mas, nas últimas semanas, esse diferencial começou a se fechar, o que naturalmente pressiona bolsa e câmbio. A notícia do IOF só potencializou esse ajuste que já vinha sendo precificado”, explica.

Na visão do analista, há espaço para uma reavaliação do cenário nos próximos dias, especialmente porque o pano de fundo segue sendo o diferencial de juros.

“O aumento do IOF, de fato, encarece o custo para o investidor estrangeiro e pressiona, inclusive, empresas que dependem de dívida externa de curto prazo. Isso pode reduzir parte dos fluxos. Por outro lado, com os ativos brasileiros ficando mais baratos e, principalmente, se o juro futuro voltar a abrir, o diferencial volta a se tornar atrativo. Isso compensa, pelo menos em parte, esse custo adicional.”

Freire também destacou o anúncio do contingenciamento de R$ 31 bilhões, que, segundo ele, surpreendeu positivamente o mercado, ao sinalizar um movimento — ainda que tímido — na direção da responsabilidade fiscal.

“Mesmo sabendo que responsabilidade fiscal não tem sido a prioridade deste governo, qualquer sinalização que aponte para algum controle das contas públicas já faz preço. Afinal, quanto menos deteriorada estiver a situação fiscal, melhor o ponto de partida para um eventual próximo governo que queira, de fato, ajustar as contas”, ressalta.

Na avaliação do analista, o investidor estrangeiro segue olhando para três pilares fundamentais na hora de decidir onde alocar capital: dívida pública sob controle, inflação ancorada e crescimento do PIB.

“Se esses elementos parecerem minimamente encaminhados, o investidor tende a ponderar o custo de entrada — como o próprio IOF — frente ao prêmio de risco ainda elevado no Brasil. Por isso, não seria surpresa se, passada essa primeira reação mais emocional, o mercado começasse a digerir melhor essas informações nos próximos dias ou semanas”, conclui.

Haddad nega intenção de desestimular investimentos

Em coletiva à imprensa, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tentou minimizar os impactos do anúncio e negou qualquer intenção de inibir investimentos.

“Revisamos os itens (investimentos no exterior) para evitar especulações sobre isso. Nosso diálogo com o mercado tem sido constante, e não temos problema em corrigir a rota”, disse.

Ele também desmentiu rumores de alterações sobre juros sobre capital próprio (JCP), dividendos ou remessas de dividendos para o exterior.

Sobre o envio de recursos para investimento, o ministro afirmou que a alíquota de 1,1% foi mantida para pessoas físicas. Ainda assim, a alíquota cheia para operações de disponibilidade pode afetar o ambiente competitivo para investimentos internacionais, como aponta Viotto.

tabela com incidência do IOF
Fonte: Ministério da Fazenda

Ruído e incertezas no radar

As mudanças no IOF deixaram claro que, apesar das intenções de simplificação e aumento de arrecadação, a percepção do mercado foi de surpresa negativa. O recado passado — especialmente para investidores estrangeiros — foi de instabilidade normativa e ausência de previsibilidade, justamente o oposto do que se espera de um país que pretende se consolidar como destino seguro de capital.

Outro ponto negativo foi o anúncio vir acompanhado do corte no orçamento, reforçando que as medidas de ajuste fiscal seguem sob a ótica da receita e não da despesa, indicando que a equipe econômica continua tratando o ajuste fiscal pelo lado da receita, sem corte de gastos relevantes.

IOF: o que é e de quanto era?

O IOF, sigla para Imposto sobre Operações Financeiras, é um tributo federal aplicado sobre operações de crédito, câmbio, seguros e relativas a títulos ou valores mobiliários. Historicamente, esse imposto é obrigatório para pessoas físicas e jurídicas que realizam transações financeiras no Brasil. Além de servir como fonte de arrecadação para o governo federal, o IOF também cumpre uma função regulatória na economia.

Criado com o objetivo de controlar a atividade econômica, o IOF permite ao governo monitorar a oferta e a demanda de crédito no país, possibilitando ajustes nas alíquotas com o intuito de conter ou estimular determinados comportamentos financeiros. A incidência do imposto, até então, variava conforme o tipo e o valor da operação.

Até aqui, o IOF sobre operações de câmbio era de 3,38%, aplicando-se a compras com cartão de crédito internacional, transferências de recursos para o exterior, saques internacionais, entre outros. Mas havia um cronograma de redução anual, a fim de eliminar progressivamente o imposto.

O cronograma estabelecido era o seguinte:

  • 2024: 4,38%
  • 2025: 3,38%
  • 2026: 2,38%
  • 2027: 1,38%
  • 2028 em diante: 0% (isenção total)

Essa mudança fazia parte do processo de adesão do Brasil à OCDE, que estabeleceu como condição a eliminação do IOF sobre câmbio, por ser considerado um entrave à livre movimentação de capitais.