O governo do Brasil acionou os Estados Unidos na OMC (Organização Mundial do Comércio), nesta quarta-feira (6), em resposta às tarifas impostas pelo presidente americano Donald Trump sobre produtos de origem brasileira. O pedido de consultas foi formalmente apresentado à missão norte-americana junto à entidade, sediada em Genebra, na Suíça.
Apesar de ter efeito prático incerto, o movimento é considerado pelo Palácio do Planalto como um gesto político relevante. A iniciativa busca reafirmar o compromisso do Brasil com o sistema multilateral de solução de controvérsias comerciais, justamente em um momento em que esse arcabouço encontra-se fragilizado.
“Ao se distanciar dos compromissos multissetoriais característicos da OMC, a medida desestabiliza o equilíbrio construído ao longo de décadas de negociações multilaterais e representa sério risco à arquitetura internacional de comércio”, diz documento interno do Itamaraty que embasa a ação.
Primeira etapa: consulta bilateral
O pedido de consultas representa o primeiro passo de um processo formal de disputa na OMC. Por meio desse mecanismo, o país reclamante busca explicações sobre as medidas comerciais adotadas pela contraparte, além de propor alterações voluntárias às práticas questionadas.
Na terça-feira (5), o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, já havia antecipado a iniciativa. Dois dias antes, na segunda-feira (4), o tema foi discutido durante a reunião do Conselho Estratégico da Câmara de Comércio Exterior (Camex), presidida pelo vice-presidente Geraldo Alckmin e integrada por ministros como Fernando Haddad (Fazenda), Simone Tebet (Planejamento), Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia).
Segundo o Itamaraty, as tarifas determinadas por Trump violam obrigações assumidas pelos Estados Unidos na OMC, incluindo a cláusula da Nação Mais Favorecida — que prevê tratamento igualitário entre todos os membros — e os tetos tarifários previamente consolidados no âmbito da organização.
Caminho travado: OMC paralisada na instância final
Caso as consultas bilaterais não resultem em acordo em até 60 dias, o Brasil poderá solicitar o estabelecimento de um painel, formado por três especialistas independentes. Essa segunda etapa tem prazo teórico de seis a nove meses, mas, na prática, pode levar até um ano — ou mais, em disputas complexas.
Ao final do painel, um relatório é emitido com recomendações. Se uma das partes discordar da decisão, pode recorrer ao Órgão de Apelação da OMC. No entanto, essa terceira e última instância está paralisada desde 2019, justamente por decisão do próprio governo Trump, que bloqueou a nomeação de novos juízes.
Com isso, mais de 20 decisões de painéis encontram-se atualmente “no limbo”, aguardando um desfecho que não pode ser dado.
Reação política e prejuízos econômicos
Embora o trâmite técnico da OMC enfrente limitações, o gesto do Brasil é visto como um esforço de defesa institucional. Internamente, o governo também busca sinalizar apoio a setores econômicos atingidos, como a indústria do cacau, que já calcula prejuízos de R$ 190 milhões com a medida americana — e alerta para o risco de paralisação de 37% do setor.
Em paralelo, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) tem cobrado ação de empresários brasileiros diante da postura hostil de Trump. Segundo ele, parte da oposição “atrapalha” a construção de uma relação bilateral mais produtiva com os EUA.
O Brasil contestou as tarifas impostas pelos EUA sob a gestão Trump, por considerá-las incompatíveis com regras da OMC, especialmente com a cláusula da Nação Mais Favorecida e os tetos tarifários já acordados.
É o primeiro passo de um processo de disputa. O país afetado solicita esclarecimentos e possíveis mudanças voluntárias das práticas comerciais do outro país.
Tecnicamente, os EUA devem aceitar, mas mesmo se recusarem a negociar, o Brasil pode pedir a instalação de um painel na OMC após 60 dias.
A instância está paralisada desde 2019, porque os EUA, sob Trump, bloquearam a nomeação de novos juízes. Isso impede a conclusão de disputas que chegam à fase final.
O governo quer marcar posição em defesa do multilateralismo comercial e mostrar apoio a setores econômicos prejudicados, mesmo sabendo que a eficácia prática é limitada.
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