Atualmente, muito se tem perguntado sobre o que é estagflação. O termo voltou a ser falado por conta do período vivido atualmente no mundo, dado que houve uma recente crise muito forte.
A alta da inflação nacional contribui para o cenário, mas ainda não é possível fechar o diagnóstico com absoluta certeza.
Este artigo aborda o tema em detalhes. Ao ler o texto, você entenderá melhor o conceito de estagflação.
Saberá quais são as origens do termo, além de identificar quando um cenário desses é caracterizado. Em seguida, verá os riscos de um processo desse tipo e tomará ciência se vivemos ou se podemos passar por uma estagflação em breve.
Aproveite e tenha uma boa leitura!
O que é estagflação?
A estagflação ocorre em um país quando se tem a combinação de estagnação econômica e aumento da inflação.
Esse cenário é agravado pelo aumento no número de demissões. Quando perdura por muito tempo, pode ter consequências bastante ruins para a economia.
Normalmente, esse quadro econômico é decorrente de um período de recessão. Não é novidade para ninguém que a crise causada pela pandemia afetou todos os países e isso está contribuindo para a formação de um cenário de estagflação. Vale frisar que o diagnóstico ainda não pode ser totalmente firmado, pois ainda se trata de uma conjectura.
De onde surgiu essa expressão?
O termo estagflação não é novo. Na verdade, trata-se de uma adaptação da expressão original stagflation. Ela foi usada inicialmente em 1965 por um político proveniente do Reino Unido. Seu nome era Ian Macleod e ele a utilizou para descrever o cenário atual vivido por seu país na época de sua atuação como parlamentar.
No entanto, foi somente no ano de 1973 que o termo foi amplamente conhecido ao ser usado para designar a fase difícil que a economia norte-americana enfrentava na chamada “Crise do Petróleo”. Na época, os países árabes pararam de fornecer a commodity aos Estados Unidos em retaliação ao apoio militar concedido a Israel.
Isso teve reflexos altamente negativos, com o preço do barril subindo 300% em apenas 6 meses. Houve controle de salários e preço, causando uma onda de demissões em massa, o que agravou ainda mais o quadro.
Em que momento uma estagflação fica caracterizada?
Em linhas gerais, para uma estagflação acontecer é preciso haver uma paralisação na atividade econômica somada a um aumento da inflação. Pelo ponto de vista da recessão, sabemos que a crise do coronavírus contribui muito para a recessão de vários setores da economia mundial, e não só a brasileira.
Já no caso da inflação, a alta do dólar tem um peso fundamental em todo esse cenário. Com a apreciação do câmbio, os produtores tendem a enviar suas mercadorias para o exterior, pois o faturamento torna-se assim maior. Isso leva a um cenário de desabastecimento, o que acarreta em um aumento de preços ainda que o consumo local não esteja tão aquecido.
No entanto, também é necessário que haja aumento do desemprego e, nesse ponto, o Brasil se sobressai.
Quais são os riscos de uma estagflação?
Seguramente, um dos efeitos mais perigosos de uma estagflação é o efeito cascata. Ele acontece por uma sucessão de fatos que estão interligados entre si, e tudo inicia exatamente pela estagnação econômica.
Pelo fato de não haver crescimento da economia, não ocorrem novas contratações. Ou ainda pior, as demissões aumentam e o nível de desemprego acelera.
Com isso, o consumo passa a ser ainda mais reduzido. Com menos dinheiro, as famílias passam a deixar de consumir os produtos que compravam anteriormente. Usam algum substituto ou até mesmo deixam de adquirir determinados itens da cesta básica, por exemplo. Isso faz com que a atividade industrial seja reduzida, já que não há necessidade de produzir grandes lotes porque não há quem os compre.
E isso remete a outro problema bastante grave: mais demissões. Com a capacidade produtiva em queda, não é possível manter tantos funcionários como antes. Pronto, a bomba relógio que estava armada explodiu, e é difícil se recuperar disso.
Outro ponto a considerar é quando, por medo da inflação, algumas famílias passam a estocar produtos. Isso causa escassez em um mercado já contraído e esse fato contribui para a elevação ainda maior da inflação.
O Brasil está em estagflação em 2022? Economistas da EQI e da EQI Asset respondem
É possível afirmar hoje que o Brasil está em estagflação? De fato, estagflação é um conceito que está relacionado a um baixo crescimento econômico e inflação alta.
Ele é simples de ser definido à primeira vista, mas complexo de ser entendido em suas raízes.
Afinal, identificar um cenário de estagflação pode causar muitas divergências de entendimento entre economistas.
Para entendermos os impactos e cenários, o portal EuQueroInvestir ouviu Denys Wiese, head de renda fixa da EQI Investimentos, e Stephan Kautz, economista-chefe da EQI Asset.
Dois especialistas, que apontaram o que podemos esperar em curto, médio e longo prazo.
O Brasil está em estagflação?
“É errado falar que o Brasil está em estagflação. O Brasil está no início de uma pequena recessão, que é normal em ciclos econômicos”, pontua Denys Wiese, head de renda fixa da EQI Investimentos.
E complementa: “O cenário de estagflação acontece quando a inflação é crescente, mas os juros tendem a não corrigir esse problema e o crescimento econômico é baixo. Trata-se de uma anomalia do ciclo econômico e se dá quando os países não dão o remédio suficiente para corrigir a inflação. A meu ver, o Brasil está dando o remédio, ou seja, está corrigindo os juros, de modo a consertar os exageros do ciclo anterior”, ele diz.
- Leia também: O que são ciclos econômicos e como ficam os investimentos no atual estágio de Brasil e EUA
Nenhum país quer pagar o preço no controle da inflação
“Contudo, o problema mundial é que os EUA e a Europa estão apresentando inflação cada vez mais alta e se eles derem o remédio necessário, que é o aumento da taxa de juros, podem criar uma crise econômica muito grande, que trará impactos importantes”, analisa Wiese.
Segundo ele, os governos mundiais podem optar por postergar essa decisão e deixar a responsabilidade para o próximo.
“Aí sim, se passarmos a conviver com inflação, sem dar o remédio necessário, isso irá definhar o crescimento da economia, nos colocando em estágio de estagflação”, explica.
O mundo está caminhando para a subida de juros, enfatiza: “Vamos ver se os governos pagarão o preço dos juros altos”.
O que os Banco Centrais devem fazer?
“Os BCs vão ter que subir juros para que a inflação não se torne perene. Se fosse antes da pandemia, os BCs poderiam absorver parte desse choque. No entanto, com a pandemia, já estávamos vendo uma tendência de alta. Todos os países já estavam ou subindo ou discutindo a subida dos juros. O Brasil reagiu de forma intensa e está na frente desse ciclo”, analisa Stephan Kautz, economista-chefe da EQI Asset.
- Saiba mais: Qual o papel dos bancos centrais na economia?
Subida de juros: quanto antes melhor
“Os juros vão continuar a subir, mesmo com uma desaceleração do crescimento. Achamos que esse é um risco importante, mas será por um bom motivo, sem acarretar consequências ainda maiores em 2023 e 2024″, diz Kautz.
Ele explica que a taxa de juros afeta a economia entre 6 a 9 meses após essa movimentação. Ou seja, o aumento dos juros definido hoje será sentido somente quando as pessoas forem contrair dívidas ou renegociar atuais parcelamentos, por exemplo.
“Quanto mais tempo os BCs demorarem para decidir, mais arrastarão os impactos para o próximo ano”, observa.
EUA: quais os riscos podem agravar a economia?
“O maior risco que temos é quanto ao atraso da retomada da economia nos EUA. Estamos vendo um processo de abertura e flexibilidade, que pode fazer com que o país volte a consumir mais serviços. Isso tiraria a pressão do consumo de bens, que teve um choque com o período de lockdown. Esse reequilíbrio do consumo de bens e serviços deve fazer a inflação desacelerar”, explica o economista.
Contudo, esse era o cenário esperado para o último semestre de 2021, o que não aconteceu por causa da variante ômicron.
“Se essa dinâmica continuar, a inflação irá demorar mais para cair. E como ela já está alta, aí falaremos de uma recessão. Este seria um risco grande: uma inflação estrutural nos países desenvolvidos, o que complicaria tudo para os países emergentes, com agravantes já nos próximos 2 ou 3 meses”.
Como identificar a estagflação?
“A definição do conceito de estagflação é complicada, porque, tecnicamente, vivemos um período semelhante somente na década de 1970, com o grande choque da oferta de petróleo”, salienta Stephan Kautz.
Ele explica que a estagflação acontece quando a economia roda abaixo de seu potencial e com alta inflação. Mas, podem existir divergências, porque o conceito de “crescimento baixo” pode ser amplo. “Para a China, 3% seria baixo. Para o Brasil, este é um crescimento forte”, exemplifica.
“O crescimento potencial de um país é dado pela capacidade de produção, população, investimento e número de pessoas empregadas. Tudo sem gerar uma inflação acima da meta. Em geral, essa correlação se quebra motivada por algum choque de oferta, conforme vimos na década de 70. Isso é o que estamos vendo hoje, com uma menor oferta do petróleo, que afeta todos os setores mundialmente”, ressalta o economista.
A estagflação poderá ser mundial?
“Cada país reage de uma forma. Os países que mais cometeram exageros durante os últimos 10 anos e durante a crise da Covid-19 são os que vão sofrer mais com a inflação, mas isso depende muito da manobra de cada Banco Central. A inflação se cura com juros altos, mas tem país em que o aumento de juros será como ‘acender uma fagulha no palheiro’.
Por exemplo, os EUA imprimiram muito dinheiro e isso não aconteceu apenas na crise na Covid. Desde a crise do subprime, o país vem inflando a base monetária e para desfazer isso é difícil. A Europa está na mesma situação, diz Denys Wiese.
“Há países que não exageraram tanto e, talvez, consigam sair desse cenário de paralisação do crescimento e de inflação alta. Já o Brasil vem tomando o remédio amargo há algum tempo. De qualquer forma, todo país acaba sendo afetado. Se a inflação é no dólar, moeda mundial, ele acabará influenciando todas as partes do mundo”, pondera Wiese.
Guerra agrava o risco de estagflação
“Na guerra, os países diminuem o comércio e postergam suas ideias de investimento, impactando no crescimento econômico.
Isso tira um pouco de pressão sobre a inflação, com risco dos mercados fazerem uma subida mais lenta de juros”, considera Wiese.
“O conflito entre Rússia e Ucrânia também deve trazer um forte choque na oferta de trigo, pois estamos falando do terceiro e quinto produtores mundiais do grão. Será difícil compensar essa a oferta no longo prazo”, analisa Stephan Kautz.
Estagflação ou recessão: o que é pior para uma economia?
Ambos os especialistas concordam: a estagflação é pior. Já a recessão pode ser vista como um “remédio amargo”, mas que precisa ser tomado.
“Quando se está em recessão, entramos em uma fase de desalavancagem da economia. As empresas e pessoas físicas vendem seus ativos para pagarem suas dívidas. É por isso que o preço dos ativos caem, porque há mais oferta. Isso é fruto dos juros altos na economia. A recessão é a consequência do remédio que foi tomado. É necessário seguir uma nova fase, o surgimento de um novo ciclo de expansão”, define Denys Wiese.
Já a estagflação, ele afirma, é um período da consequência de “um remédio que não foi tomado quando era necessário”. “Quando se decide fazer isso tardiamente, a dose tem que ser cavalar, com juros muito altos para corrigir essa falha. Muitas vezes, o país opta por não fazer esse tratamento”, analisa.
Estagflação: uma morte lenta
“A recessão dói mais no curto prazo. Mas, se resolve no longo prazo. A estagflação é como uma morte lenta: não se sente tanto a dor no curto prazo, mas pode comprometer a próxima geração. A meu ver, é melhor pagar o preço antes, para desfrutar no futuro de uma vida melhor”, pondera o head de renda fixa.
Recessão: melhor para o mercado de trabalho
“A recessão é só um apertar de cinto, um ajuste. Evitá-la apenas adia o problema. O mercado de trabalho sofre, mas o efeito é mais rápido e as pessoas não perdem a capacidade de voltar ao mercado. Já em uma estagflação duradoura, as pessoas ficam desempregadas por mais tempo. Isso faz com que elas percam treinamento e networking”, comenta Stephan Kautz.
Estagnação compromete a capacidade de produção em médio prazo
“As empresas, quando veem este cenário, param de produzir. O maquinário fica defasado, porque novos investimentos acabam sendo adiados e a capacidade de produção fica comprometida. É muito perigoso em médio prazo, pois corrói a estrutura que existe hoje e atrasa muito uma retomada”, analisa o economista.
Estagflação: quanto tempo pode durar no Brasil?
“No Brasil, estamos vivendo uma pequena recessão. Quando a inflação começar a ceder, em função dos juros altos que já estamos tendo, abre-se espaço para a queda dos juros e, assim, inicia-se uma nova fase de expansão. Imagino que passadas as eleições, em 2023, já iniciaremos um novo ciclo”, diz Denys.
E no mundo?
“É impossível prever, vai depender da reação dos Bancos Centrais quanto à contenção da inflação. Os EUA e Europa têm contextos difíceis de manobrar. Um cenário de estagflação pode durar 2, 5, 10 anos ou mais. Já aconteceu com o Japão que permaneceu em um cenário assim durante décadas. Mas isso só aconteceu, pois os governantes não tomaram as decisões necessárias”, observa.
Câmbio: real tem sofrido impactos menores
“Um ponto importante a ser observado é a taxa de câmbio. Em um momento com muita incerteza, o porto seguro é o câmbio. E o real tem se apreciado, tem ido bem. Esse é um ponto que talvez possa nos ajudar a evitar consequências mais duras. Talvez, o BC não tenha que subir tanto os juros e os impactos no ano que vem não sejam tão grandes”, pondera o economista da EQI Asset.
O que beneficia o câmbio?
“O BC foi ágil na alta de juros, que ficaram mais altos em termos reais e nominais frente a outros países. Com a guerra, países emergentes que recebiam fluxo de investidores como a Rússia, Bulgária, Romênia e Turquia, não estão mais recebendo. Os investidores estrangeiros estão buscando outros países como o Brasil, que se torna uma opção mais segura. Mais de R$ 45 bilhões entraram no Brasil de janeiro a março de 2022”, comenta Kautz.
Quais são os setores que deverão sofrer mais dentro deste cenário?
“Em um cenário de estagflação, a renda das pessoas é muito corroída, diminuindo o poder de consumo. Os setores que mais sofrem são o varejo e compra de imóveis, por exemplo.
Quando se aumenta os juros fortemente, a economia como um todo ‘tomba’. Se não aumentar, a inflação vai corroendo o dinheiro dos mais pobres e começa a haver descontentamento popular.
Não tem para onde correr: ou enfrentar a queda do PIB ou o descontentamento da população diante de uma inflação alta”, define Denys Wiese.
Estados: problema que gera inflação é estrutural
“Os governos adotam uma política monetária de impressão de dinheiro para jogar na economia, porque a política fiscal já está estourada: ou seja, arrecada e gasta. O problema é que os estados estão gastando demais. Mas eles, por sua vez, não podem pedir mais impostos para a população”, afirma Wise.
E complementa: “O correto, então, seria diminuir o tamanho dos estados para sobrar dinheiro para a população. Mas, não há vontade nesse sentido. Essa política monetária apenas alimenta o ciclo. Não é o Banco Central que precisa reagir, todo o sistema estadual precisa ser encarado como raiz desse problema”, observa.
Quais os melhores investimentos para um cenário de estagflação?
Para Denys Wiese, em cenários de inflação em alta e baixo crescimento, é preciso estar protegido da inflação.
“Na renda fixa, é importante ter papéis IPCA +. Nas ações, as que irão performar melhor são as de valor, com crescimento mais baixo e mais estabilizadas. Imóveis, terrenos, metálicos e commodities são boas reservas, terão o capital corrigido pela inflação. Já as criptomoedas são muito voláteis, embora estejam despertando o interesse das pessoas”, observa.
Quais estratégias de alocação?
“Para uma boa alocação é preciso manter uma ‘pizza de diversificação’, de acordo com o perfil do investidor.
É preciso aproveitar as rápidas subidas e quedas de algum ativo para fazer os rebalanceamentos, no sentido de vender a classe que está cara e comprar um pouco mais da classe que está barata.
Nunca se deve entrar no jogo ou tudo ou nada. A melhor estratégia é seguir no gradualismo para construir patrimônio no longo prazo”, conclui Wiese.

Alocação recomendada de acordo com a estratégia de cada perfil de investidor. Fonte: EQI Investimentos
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