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Apple promete investir US$ 600 bilhões nos EUA: “Falar é fácil, executar é difícil”, aponta analista

Apple promete investir US$ 600 bilhões nos EUA: “Falar é fácil, executar é difícil”, aponta analista

Em um anúncio realizado diretamente da Casa Branca na quarta-feira (6), a Apple (AAPL; AAPL34) confirmou a ampliação de seu compromisso de investimentos nos Estados Unidos (EUA), elevando de US$ 500 bilhões para US$ 600 bilhões o montante previsto para os próximos quatro anos. O evento contou com a presença do CEO da empresa, Tim Cook, e do presidente norte-americano Donald Trump, que celebrou o anúncio como uma “vitória da manufatura americana”.

No início deste ano, a companhia já havia anunciado que investiria US$ 500 bilhões e contrataria 20 mil trabalhadores em todo o território americano nesse período. O novo pacote prevê a expansão da produção nacional de componentes estratégicos e a possibilidade da construção de uma nova fábrica no país.

O governo trata o anúncio como mais um passo em sua estratégia de reindustrialização e redução da dependência de fornecedores asiáticos, especialmente da China.

Entretanto, o anúncio, amplamente divulgado por Trump em seus canais oficiais, foi recebido com ceticismo por parte do mercado e de analistas especializados. Para Marink Martins, analista internacional da EQI Research, o gesto tem mais peso político do que econômico.

Trump anunciou no mesmo dia uma tarifa de 100% sobre semicondutores fabricados fora dos EUA, numa tentativa de pressionar empresas a produzirem chips em território norte-americano. Isso é uma mudança em relação à política anterior, quando sua administração havia isentado smartphones, computadores e outros eletrônicos das rodadas de tarifas sobre importações chinesas.

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A Apple continua fabricando a maior parte de seus produtos — incluindo iPhones e iPads — na Ásia, principalmente na China, embora tenha transferido parte da produção para o Vietnã, Tailândia e Índia recentemente.

Apesar da pressão política, analistas concordam que fabricar iPhones nos Estados Unidos ainda é inviável, devido ao custo da mão de obra e à complexidade da cadeia global de suprimentos.

“MAGA virou MTAG”

Em análise disponível no aplicativo EQI+, Martins relembrou o conceito ricardiano de especialização econômica, segundo o qual países devem concentrar sua produção naquilo que fazem de forma mais eficiente. Ele destacou que, historicamente, a Apple se beneficiou dessa lógica ao terceirizar boa parte da sua manufatura para países asiáticos, como China e Vietnã, que oferecem mão de obra mais barata e redes de fornecimento mais robustas.

“Trump não está sendo nem ricardiano, nem schumpeteriano (referência à teoria da destruição criativa, com surgimento de modelo de produção inovador). Isso é uma política forçada de conteúdo local, como vimos no Brasil com a Petrobras no pré-sal. A Apple vai acabar sofrendo o mesmo mal”, afirmou o analista, referindo-se aos elevados custos e à ineficiência potencial da transferência de linhas de produção para território americano.

Martins ironizou ainda a retórica de Trump, ao sugerir que o slogan “Make America Great Again” teria sido convertido em “Make Trump Appear Great” (MTAG). Para ele, o foco do ex-presidente não é a viabilidade econômica da proposta, mas seu marketing pessoal.

Apple: gigante de caixa, tímida em investimento

Apesar do tom otimista do governo, o compromisso da Apple com novos investimentos foi colocado em dúvida por Marink, que apontou inconsistências no modelo financeiro atual da companhia. Segundo ele, embora a empresa gere cerca de US$ 100 bilhões em caixa operacional por ano, a maior parte desses recursos tem sido utilizada para recompra de ações (85%) e distribuição de dividendos (15%).

“A Apple é a única entre as big techs que não embarcou nos altos investimentos em inteligência artificial. Sua estratégia tem sido segurar valor para os acionistas, não investir pesadamente em infraestrutura”, observou.

Ele também destacou que o patrimônio líquido da Apple, apesar de seu valor de mercado ultrapassar US$ 3 trilhões, é inferior ao da Petrobras — um dado que reforça a ideia de que a empresa tem distribuído, em vez de reter, seus lucros.

Pressões e alternativas

Para cumprir o novo compromisso de investimento, Martins acredita que a Apple terá de rever suas prioridades financeiras.

“Ou ela reduz o ritmo de recompra de ações e distribuição de dividendos, ou ela se alavanca, tomando dívida no mercado”, afirmou.

Segundo ele, o histórico recente da empresa sugere que a primeira alternativa pode encontrar forte resistência dos acionistas, especialmente após os episódios em que a recompra de ações sustentou os preços dos papéis.

Um iPhone a US$ 3.500?

Outro ponto crítico levantado por analistas é o custo de produção doméstico. Dan Ives, da Wedbush Securities, classificou como “insanidade” a ideia de fabricar iPhones nos Estados Unidos. Segundo ele, o preço final do aparelho poderia saltar para US$ 3 mil ou até US$ 3.500, devido aos altos custos com mão de obra e infraestrutura.

“O problema é que a mão de obra nos EUA é escassa e cara demais”, reforçou Marink. “Falar é fácil, executar é difícil. Até Tim Cook pareceu constrangido ao ser chamado por Trump na Casa Branca.”