Durante a Money Week, Paulo Guedes fez uma provocação que traduz bem a situação econômica latino-americana nas últimas décadas: segundo ele, a região se transformou na “Atlântida da economia global”. Assim como o continente mítico que afundou, a América Latina teria desaparecido do mapa do crescimento mundial, ficando cada vez mais distante das economias que avançaram.
Não é exagero. Os dados confirmam a visão de Guedes.
Os números mostram que, nos últimos 40 anos, a região correu em marcha lenta, enquanto o restante do mundo acelerava. O Brasil, claro, está no centro dessa história. Desde os anos 1980, o país perdeu posições no ranking global de renda, mostrando que a sensação de estagnação não é impressão: é realidade medida em dados.
O Brasil no retrovisor do mundo
O contraste mais marcante está na comparação com a Ásia emergente. Em 1980, a renda média per capita desses países representava apenas 11% da brasileira, já ajustada pela paridade de poder de compra. Cinco décadas depois, em 2030, o FMI projeta que essa proporção chegará a 92%.
Em outras palavras: economias que eram extremamente pobres no fim do século XX alcançaram quase o mesmo nível de riqueza do Brasil, o que faz o país se tornar a Atlântida da economia global.
Enquanto isso, a América Latina como um todo se manteve estável em relação ao Brasil — o que, na prática, significa que todos perderam espaço juntos. Esse atraso relativo não é apenas uma estatística distante: ele se reflete no bolso do cidadão. A classe média brasileira, por exemplo, sente cada vez mais o peso da desvalorização relativa da moeda e da perda de poder de compra em comparação global. Viagens internacionais, bens importados e até mesmo serviços dolarizados se tornam progressivamente menos acessíveis.
As raízes do atraso
Várias explicações são levantadas para esse empobrecimento relativo. Três fatores aparecem de forma recorrente:
- Educação insuficiente: a formação de capital humano continua aquém do necessário para sustentar ganhos de produtividade.
- Baixa poupança: a capacidade de financiar investimentos internos é limitada, o que restringe o crescimento sustentado.
- Ambiente de negócios hostil: burocracia, insegurança jurídica e falta de competitividade travam empresas e desestimulam investimentos.
Mas o problema não para aí. O Brasil enfrenta hoje um desafio fiscal crescente e uma mudança demográfica profunda. A população está envelhecendo rapidamente, pressionando gastos previdenciários e de saúde ao mesmo tempo em que a força de trabalho encolhe. Essa combinação tende a reduzir ainda mais a capacidade do país de crescer de forma robusta.
O peso da demografia
As estatísticas populacionais reforçam essa preocupação. Desde 1970, a pirâmide etária brasileira mudou drasticamente. Se antes predominavam jovens em idade ativa, hoje o número de idosos cresce em ritmo acelerado. Isso significa menos trabalhadores produzindo e mais dependentes exigindo suporte do Estado. Essa transição, já visível no presente, tende a se intensificar nas próximas décadas.
Na prática, será cada vez mais difícil sustentar o sistema previdenciário e financiar saúde pública sem comprometer ainda mais as contas públicas. O risco de se entrar em um ciclo de baixo crescimento e alto endividamento é real.
Há saídas possíveis?
Apesar do diagnóstico desanimador, o cenário não é de derrota completa. Alguns países latino-americanos vêm avançando em produtividade e integração internacional, o que mostra que o continente não está condenado à irrelevância. O Brasil, se quiser evitar a imagem da Atlântida da economia global que afunda, precisa atacar seus gargalos históricos: investir em educação de qualidade, criar condições para mais poupança e tornar o ambiente de negócios menos hostil ao capital produtivo.
Enquanto essas reformas estruturais não acontecem, cabe ao investidor brasileiro buscar alternativas. Diversificação internacional não é apenas recomendação teórica: é estratégia prática de sobrevivência patrimonial. Afinal, se o país continua a perder posição relativa no cenário global, faz sentido que o portfólio individual acompanhe o movimento das economias que crescem.
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