Com os juros nominais entre 13% e 14% ao ano, a renda fixa brasileira chama atenção de investidores estrangeiros, especialmente quando comparada às taxas oferecidas por economias desenvolvidas.
Nos Estados Unidos, por exemplo, os rendimentos atuais giram em torno de 5% ao ano. Mas, diante das incertezas do mercado e da volatilidade cambial, vale a pena o gringo investir no Brasil?
A resposta, segundo os analistas da EQI Research, Felipe Paletta e João Neves, depende de uma série de fatores que vão além do retorno bruto.
“À primeira vista, os juros brasileiros parecem extremamente atrativos”, afirma Felipe Paletta. “Mas é preciso lembrar que o investidor estrangeiro está correndo um risco importante: o da moeda. Se o real se desvaloriza frente ao dólar, todo aquele ganho que parecia garantido pode desaparecer.”
Essa lógica está por trás de uma estratégia bastante conhecida no mercado internacional: o carry trade. A prática consiste em tomar empréstimos em países que oferecem juros baixos, como Japão ou Suíça, e aplicar os recursos em países com taxas mais elevadas — caso do Brasil. O investidor, nesse caso, lucra com a diferença entre os juros pagos e os recebidos.
“Em tese, é um movimento simples: você pega dinheiro barato em uma moeda forte e aplica onde o juro é alto. Mas, na prática, os riscos são grandes, especialmente quando se trata de países emergentes como o Brasil”, explica João Neves.
“O histórico cambial do real mostra que, desde o Plano Real, a moeda brasileira perdeu em média cerca de 8% ao ano frente ao dólar. Isso pode facilmente anular os ganhos do investidor.”, complementa.
Vale a pena o gringo investir no Brasil?
Apesar dos riscos, muitos investidores, especialmente institucionais, continuam recorrendo ao carry trade em busca de rentabilidades maiores. Para reduzir o risco cambial, uma alternativa comum é o uso do hedge, uma proteção contratual contra a variação da moeda. No entanto, essa proteção tem um custo, que pode reduzir significativamente o retorno líquido da aplicação.
“Alguns investidores fazem esse hedge justamente para preservar o ganho em real, mesmo abrindo mão de parte do rendimento. Outros preferem correr o risco cambial acreditando que a moeda vai se manter estável ou até se valorizar, o que aumentaria ainda mais o retorno”, observa Paletta. “Mas essa é uma decisão que precisa ser muito bem calculada.”
Outro fator que influencia diretamente a atratividade da renda fixa brasileira é a inflação. Caso o índice de preços supere as projeções, o retorno real da aplicação diminui, frustrando as expectativas iniciais. Além disso, o investidor precisa considerar o estágio do ciclo econômico brasileiro, que pode impactar diretamente o desempenho dos ativos de renda fixa.
“Em alguns momentos, mesmo com juros altos, o Brasil pode apresentar desempenho pior do que seus pares internacionais. Por isso, a análise do contexto macroeconômico é essencial antes de tomar qualquer decisão”, reforça João Neves.
Há ainda, segundo os analistas, um novo elemento no radar dos investidores internacionais: o debate sobre o enfraquecimento do dólar como moeda de reserva global. A discussão levanta dúvidas sobre o comportamento do câmbio em escala global, o que adiciona mais uma camada de incerteza à decisão de investir em países emergentes.
“É um cenário diferente do que víamos anos atrás”, destaca Neves. “Hoje, o próprio dólar tem oscilado frente a outras moedas, o que exige ainda mais cuidado. Não é só o real que oferece risco.”
Para Paletta, o ponto central é que, embora o Brasil já tenha sido — e possa voltar a ser — uma excelente oportunidade de retorno para o capital estrangeiro, o risco cambial é o grande divisor de águas. “Não dá para ignorar esse fator. Ele é absolutamente decisivo na hora de saber se, de fato, vale a pena para o gringo investir no Brasil.”