O ano de 2022 já está sendo marcado por um conflito que dá margem a vieses “orientais” e “ocidentais”. E no meio dessa guerra de narrativas, como ficam os investimentos?
Para essa análise, a EQI Investimentos convidou Alexandre Viotto, Head de Banking e Câmbio; Denys Wiese, Head de Renda Fixa, e Bruno Soller, analista eleitoral, para discutirem os possíveis cenários em 2022 em live EQI Talks realizada nesta quinta-feira.
A seguir, entenda os impactos do conflito entre Ucrânia e Rússia aqui no Brasil, e como vai se comportar o mercado daqui para frente em um ano eleitoral.
Guerra de narrativas e os impactos na economia mundial
Alexandre Viotto , Head de Banking e Câmbio da EQI, explica os vieses pelos quais a análise de uma guerra perpassa na divisão de mundo entre lado “ocidental” e “oriental”.
“De modo geral, percebemos dificuldades em compreender o cenário como um todo. Estamos no ocidente e, portanto, acabamos tendo um viés para o lado ocidental, sem olhar muito para o que está acontecendo no lado oriental”, explica Viotto.
E, de fato, ao analisar historicamente a cobertura midiática em cada região, é possível perceber uma verdadeira guerra de narrativas entre ambos os lados.
Nesse sentido, muitas opiniões se dividem entre a condenação da movimentação russa e uma percepção de tenacidade com relação à defesa da Ucrânia por parte dos demais países.
No entanto, para dirimir dúvidas, Alexandre Viotto propõe analisar o contexto de forma mais ampla, examinando alguns dos acontecimentos mais marcantes. Tais como:
Fatores de impacto na política externa dos países
Segundo o especialista, são, basicamente, três fatores relevantes:
- Segurança Energética;
- Segurança Alimentar;
- Segurança Territorial.
A partir deles, é possível identificar reflexos em situações como:
Análise dos votos no Conselho de Segurança da ONU
A sessão emergencial, que tinha o objetivo de votar a resolução condenando a ofensiva militar russa na Ucrânia, teve como resultado:
- 11 votos a favor:
- 1 voto contra (Rússia);
- 3 abstenções: (Emirados Árabes, China e Índia).
“É preciso entender que a abstenção de um país significa a sinalização para a necessidade de analisar mais dados. E, para isso, cada nação parte de um objetivo específico”, ressalta o head de câmbio da EQI.
Para que seja possível compreender os motivos de divergência de cada região e país, ele, destaca alguns pontos:
Europa
- Dependente do petróleo e do gás russo e está sem alternativas energéticas no momento;
- A região depende da OTAN para a segurança;
- A escalada no conflito aumenta a preocupação com refugiados.
Motivos específicos por país europeu
- Alemanha: em termos de geração de energia, a Rússia tem uma importância para este país equivalente a 1,5 vezes a de uma Itaipu para o Brasil;
- França: tem atuado na diplomacia e na contenção do conflito dentro das fronteiras da Ucrânia;
- Polônia: quer uma postura mais ativa dos EUA.
EUA
- Foco na contenção do conflito na Ucrânia;
- Suspensão momentânea da expansão da OTAN;
- Resolução pela diplomacia, pela vice-presidente americana Kamala Harris;
- Tendência a insistir nas sanções econômicas, mas de forma equilibrada.
China
- Tende a aumentar sua influência internacional;
- Divergências com Taiwan ficam mais óbvias e podem fomentar uma ação semelhante à ocorrida entre Rússia e Ucrânia;
- País tem comprado petróleo e gás russos a preços descontados;
- RMB (Renminbi) passa a ser alternativa viável ao USD para comercialização de petróleo e gás.
Rússia
- Não deverá abrir mão do território conquistado;
- Tem como objetivo ser respeitada como potência;
- Tende a parar o avanço da OTAN para o Leste Europeu.
Ucrânia
- Tendência a estender o conflito ao máximo;
- Tentativa de manter o apoio do Ocidente;
- A partir de um cessar-fogo, deve tentar buscar a garantia de uma relativa autonomia.
Sanções contra Rússia podem não surtir efeitos
“Não existe na história nenhum regime que tenha caído apenas por sanções econômicas. Temos vários exemplos, como a Cuba de Fidel Castro, o Iraque de Saddam Hussein e a atual Coreia do Norte. A sanção, por si só, não tem muito efeito, é preciso esperar alguma resolução do campo diplomático”, observa Viotto.
Apesar da narrativa maniqueísta, conflito não deve ter escala nuclear
“Precisamos abandonar a análise do conflito a partir de uma abordagem do ‘bem contra o mal’. Além disso, não acreditamos em um cenário no qual haverá conflito nuclear”.
Cenário mundial para as commodities: valorização ajuda países emergentes
- Mercado segue com volatilidade nos preços do Petróleo e Gás;
- Volatilidade também nos preços dos metais;
- Inflação tende a seguir pressionada no mundo todo;
- Valorização das commodities ajuda países emergentes.
Cenário mundial para as moedas: real tende a se valorizar
- Dólar: se beneficia com piora no conflito;
- Euro: deve sofrer pressões com manutenção da guerra;
- Real: tende a se valorizar com a situação atual.
Cenário econômico antes da guerra
O Head de Renda Fixa na EQI Investimentos, Denys Wiese, observa que o contexto econômico mundial antes da guerra entre Rússia e Ucrânia já indicava um cenário inflacionário e de tendência de aumento de juros nos EUA.
Pandemia fez impressão de dólar bater recorde
“Analisando dados históricos que relacionam a quantidade de impressão de dinheiro nos EUA x aumento da inflação, percebemos que, nos últimos 20 anos, essa correlação se desfez. Nesse período, foi criado mais dinheiro, mas com menor inflação. Algumas explicações para isso podem ser o fato de que grande parte deste dinheiro não foi aplicado na economia e, também, a evolução da tecnologia, que ajudou nessa contenção”, ele explica.
Mas, o que chama mais a atenção, diz, é que com a pandemia da Covid-19, os EUA imprimiram muito mais dinheiro do que em toda a sua série histórica, desde 1875. “Nunca se imprimiu tanto dinheiro”.
Subida da taxa de juros dos EUA não começou
“A meta é de 0,25% ao ano, mas ela ainda está estagnada em 0,08% ao ano”, pondera Denys.
E o que esperar diante destes dois aspectos? De acordo com Denys Wiese, alguns pontos são:
Inflação mundial não deve ceder
- Comércio internacional ficará restrito com a guerra;
- Custos subirão a partir de redução na oferta;
- Realização de investimentos pelo setor produtivo deve ser adiada;
- Sanções econômicas impostas à Rússia agravarão o contexto inflacionário mundialmente.
Olhos voltados para a economia americana
O Head de Renda Fixa da EQI projeta dois possíveis cenários:
-
Avanço da guerra
Se a guerra continuar, o crescimento mundial será menor e os juros americanos devem ficar mais baixos.
“Nesse cenário, vemos logo à frente uma estagflação: situação de baixo crescimento, mas com inflação mais alta”, alerta Denys.
-
Arrefecimento da guerra
Se a guerra acabar rapidamente, o FED irá normalizar a política monetária nos EUA.
“Se essa normalização for rápida no aumento de juros, o PIB americano cairá na mesma velocidade. Isso trará um cenário ruim para os investidores.
Já se o aumento dos juros for mais lento, a economia tende a fazer um pouso mais suave.”, explica.
Contudo, Wiese observa que não há como prever quanto tempo esses ajustes na economia americana devem levar. “Estamos falando de algo que pode durar de um a cinco anos, por exemplo”, explica.

Reprodução/EQI
Recomendações para os investidores
“O investidor não deve ser ‘herói’, deve procurar qualidade, não se alavancar, indo devagar perante o contexto internacional”, orienta Denys.
- É hora de ser seletivo quanto aos investimentos;
- Procurar profissionais para orientação da carteira;
- Mercado de ações: preferência às ações que não precisam de alavancagem para crescer;
- Mercados mais consolidados como: alimentos básicos, saneamento e energia tendem a ter melhor performance;
- Comprar dólar para se proteger.
É o ano da renda fixa
“Aproveitem os pré-fixados, papéis com rendimento IPCA +7 isentos e títulos do Tesouro. Já na renda variável, veremos altos e baixos, mas sem ganhos reais. Quem gosta de ações deve apostar em ações de valor, com menores riscos ou em Fundos de investimentos”, conclui o especialista da EQI.
Impactos no contexto global da guerra
Para Bruno Soller, especialista em estratégia eleitoral e pesquisa de opinião pública, alguns pontos merecem destaque:
Governo americano
“No contexto político dos EUA, sempre vimos presidentes muito fortes, à frente de uma grande potência militar. No entanto, o atual governo tem uma característica diferente tanto com relação à figura de Biden, quanto à de Kamala Harris”.
Conflito bélico tem impactos mais fortes na economia
“O que estamos vendo agora é uma verdadeira guerra econômica, pois o mundo está cada vez mais integrado. É impossível calcular, no momento, os impactos que as sanções à Rússia causarão na economia global”.
Repercussão do conflito é maior do que Rússia esperava
“Estamos diante de um novo desenho no cenário internacional. Talvez, a Rússia esperasse um conflito nas dimensões do que aconteceu na Criméia. Mas, o crescente nacionalismo ucraniano tem surpreendido, o que tem aumentado a repercussão negativa”.
Rússia pode viver um isolamento perigoso
“Apesar da Rússia ser uma grande potência, parece que há risco de um isolamento perigoso. Prova disso é que a China, parceira de primeira hora, tem se mostrado mais preocupada com a economia, do que com o posicionamento geopolítico”.
Análise dos impactos da guerra na política brasileira
Para Bruno Soller, “a guerra entre Rússia e Ucrânia deve abalar as estruturas da eleição brasileira com impactos gigantescos”.
Ele destaca questões como:
Aumento do diesel desfavorece atual governo na corrida eleitoral
“O Brasil é um país pobre, com mais de 55% da população que vive com uma renda familiar menor que 1.500 reais por mês. Se somarmos quem vive com menos de 3 mil reais por mês, chegamos a 76%.
Essas movimentações no preço dos combustíveis impactam, portanto, diretamente no bolso da maioria do eleitorado.
Isso em um momento em que Bolsonaro começava a ter uma curva de crescimento na disputa presidencial, devido às questões econômicas com o advento do Auxilio Brasil, que fez com que o presidente começasse a penetrar na classe D, que tipicamente vota em candidatos ‘lulistas’”.
Empobrecimento da população: desejo de mudança presidencial
“Estamos vendo ainda uma população em uma alta taxa de desemprego, com baixo poder de compra e com falta de crédito. Todos esses fatores geram uma sensação ruim no eleitor que passa a querer mudanças. Isso fortalece a figura de Lula, que passa a ser visto novamente pela grande população como uma alternativa viável”.
Popularidade de Bolsonaro aumentou com Auxílio Emergencial
“Durante o pagamento do Auxílio Emergencial, Bolsonaro viveu um momento de alta em sua popularidade, recebendo grande taxa de aprovação. O corte do auxílio foi correto do ponto de vista econômico, mas equivocado do ponto de vista eleitoral”.
Guerra interrompe momento de alta de popularidade de Bolsonaro
“O conflito trouxe complicações econômicas no momento em que Bolsonaro vivia uma recuperação nas pesquisas”.
Terceira via não apresenta nenhum candidato forte
“Os candidatos fora da polarização entre Lula e Bolsonaro não apresentam nenhuma novidade para a população. Vemos, por exemplo, que no momento de baixa da popularidade de Bolsonaro, Sérgio Moro, cresce, mas alcança apenas 12% das intenções”.
Guerra pode complicar percepção sobre governo atual
“Bolsonaro terá de lidar com os desdobramentos econômicos do conflito entre Rússia e Ucrânia. Isso poderá favorecer um outro candidato do ‘anti-lulismo’. O problema é definir quem seria esse candidato. O cenário ainda está muito aberto”, diz.
“Sérgio Moro parece não conseguir empolgar o eleitorado. João Dória tem uma alta taxa de rejeição devido a diversos fatores. Eduardo Leite, Simone Tebet e Alessandro Vieira ainda são nomes muito desconhecidos. Já Ciro Gomes tem dificuldade de romper a bolha da classe média alta de esquerda”.
Ameaça de paralisação dos caminhoneiros
“O aumento do diesel incomodou a classe, que tem ameaçado uma paralisação. Isso traria uma inflação ainda maior. Precisamos acompanhar os impactos de uma possível greve dos caminhoneiros, já que temos muita dependência do modal rodoviário”.
Política Brasileira e Internacional: como ficam os investimentos?
“O cenário mundial é bastante complicado. Em comparação à economia americana, que é como se fosse um transatlântico, o Brasil é um jet ski, mais fácil de manobrar, por questões de relevância e de tamanho”, compara Wiese.
Por aqui, o Banco Central já tem tomado medidas para conter a inflação com a subida de juros. Estamos à frente da curva.
“Embora a inflação ainda não tenha cedido, já estamos tomando o remédio amargo. Isso pode nos dar uma ‘ressaca’ e, com certeza, o ano de 2022 será de PIB com crescimento baixo, se não, zero”, complementa.
Já em termos políticos, o otimismo para 2023 é que tudo está levando para o centro, onde temos 50% de eleitores moderados.
“Invariavelmente, o vencedor da disputa eleitoral deve ser moderado no discurso e na economia, o que deve trazer equilíbrio nas contas públicas”, conclui Denys Wiese.
Bruno Soller reforça a necessidade de olhar para o centro em um momento de turbulência.
“Vemos os dois candidatos mais fortes olhando para uma moderação. Especula-se até que o vice-presidente de Bolsonaro venha a ser o ex-presidente da Fiesp, Paulo Skaf, alguém que sabe dialogar com o setor produtivo. Do outro lado, Lula tem Geraldo Alckmin, um antigo desafeto, mas que reforça a mensagem de moderação. Esperamos que uma moderação reduza o impacto geral econômico para a população”, finaliza Soller.
- Confira a live na íntegra:
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