O último 1º de julho marcou a passagem de mais um ano do Plano Real, que completou agora 27 anos de existência.
Criado em 1993, o projeto consistia em estabilizar a economia brasileira e controlar a inflação estratosférica que assolava o país.
Com índices batendo a casa dos quatro dígitos, a meta era realizar o “corte de três dígitos” na inflação e reequilibrar a economia brasileira.
Antes do Plano Real
Antes da nova moeda ser implantada, a economia brasileira se encontrava fortemente abalada pela hiperinflação.
Entre as causas para o aumento generalizado de preços estavam o aumento dos gastos públicos durante o governo militar, o alto endividamento externo, a crise mundial dada pelo aumento nos preços do petróleo, entre outros.
Para se ter uma ideia, em 1989 o índice de inflação chegou a bater em 82,39% ao mês, ou seja, o mesmo produto chegava a quase dobrar de preço de um mês para o outro. Neste mesmo ano, a taxa anual de inflação chegou a atingir 1.972,91%.
Um ano depois, em 1990, sob efeito de uma nova e fracassada tentativa de conter o aumento generalizado dos preços dada pelo Plano Collor, a inflação anual foi de 1.621%.
Esse índice seguiu registrando fortes altas mensais e anuais até atingir seu ápice em 1993 quando registrou uma inflação de quase 2.500% no ano.
Em meio a esse cenário de forte incertezas e instabilidade econômica, a ida das famílias aos supermercados era diária no intuito de driblar a alta de preços e manter os estoques abastecidos.
Planos fracassados
Entre 1986 a 1992 o governo aplicou uma série de planos econômicos que buscavam acabar com a hiperinflação que corroía o poder de compra da população.
Para isso, foram implementados no país cinco planos econômicos de controle inflacionário:
- Plano Cruzado 1 (fevereiro de 1986)
- Plano Cruzado 2 (novembro de 1986)
- Plano Bresser (junho de 1987)
- Plano Verão (janeiro de 1989)
- Plano Collor I (março de 1990)
- Plano Collor II (janeiro de 1991)

Fonte: Bacen
Todos falharam em pôr fim à forte oscilação de preços. Esse fracasso nas estratégias que antecederam o Plano Real é atribuído ao congelamento de preços.
Ou seja, os produtores não podiam repassar os aumentos de custos ao consumidor final dado o congelamento, então, para não saírem no prejuízo, diminuíram a produção, ocasionando a escassez de produtos nas prateleiras.
Reforma monetária
Além dos seis planos criados no intuito de controlar a inflação, foram lançadas ainda quatro moedas, entre 1986 a 1993, para tentar reaver o controle da economia.
- Cruzado – de 1986 a 1989
Com o alto índice de inflação, o Brasil mudou de moeda e cortou três zeros em relação ao Cruzeiro, moeda anterior.
- Cruzado Novo – 1989 a 1990
Ainda sob forte inflação, foi criada uma nova moeda e efetuado o corte de três zeros em relação à moeda anterior, o Cruzado.
- Cruzeiro – 1990 a 1993
No primeiro ano de governo do Presidente Collor, a moeda voltou a se chamar Cruzeiro, entretanto, não houve corte de zeros em relação ao Cruzado Novo.
- Cruzeiro Real – 1993 a 1994
Em agosto de 1993 foi criado o Cruzeiro Real como uma preparação para o Plano Real. Nesta etapa houve o corte de três zeros em relação ao Cruzeiro.
Plano Real: origem e tentativas de equilibrar a economia do Brasil
No final de 1993, o então Presidente Itamar Franco convidou Fernando Henrique Cardoso, então Ministro das Relações Exteriores, para assumir o Ministério da Fazenda.
FHC formou uma equipe econômica que contava com nomes como Pérsio Arida, André Lara Resende, Gustavo Franco e o presidente do Bacen, Pedro Malan. O foco era controlar a hiperinflação que atormentava o país a mais de 30 anos.
Para se ter uma ideia, a inflação acumulada de 1965 até 1994 foi de aproximadamente 1 142 332 741 811 850% (IGP-DI).
O objetivo era aplicar o novo plano de forma gradual, seguindo o cronograma estabelecido.
Dessa forma, a equipe tomou o cuidado de não aplicar nada de surpresa, conforme havia acontecido com os planos anteriores. Então, a substituição da moeda seria feita de forma natural, sem que houvesse congelamento nos preços dos produtos.
Plano real: implementação em três fases
Para que a nova moeda tivesse êxito na economia brasileira, foi traçado um plano que se dividia em três fases:
1.Ajuste fiscal com a criação do Programa de Ação Imediata (PAI)
O PAI foi criado em julho de 1993 no intuito de restabelecer o equilíbrio nas contas públicas. A ideia era preparar a economia para receber o lançamento do Plano Real no ano seguinte.
Para isso uma série de medidas foram tomadas sendo a aprovação do Fundo Social de Emergência (FSE) uma das mais significativas.
Isso porque o Fundo buscava aumentar a arrecadação tributária aplicando um percentual de 15% sobre a arrecadação de todos os impostos da União.
A proposta era desvincular as verbas do orçamento da União, direcionando os recursos para o Fundo. Isso daria ao governo margem para remanejar e/ou cortar gastos públicos supérfluos.
Em 1993 os gastos públicos aproximavam a casa dos US$ 7 bilhões e para controlar a inflação era necessário realizar cortes e contenção dos gastos públicos.
Além disso, foi criado o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF), que era temporário e incidia de 0,25% de alíquota sobre o valor de todas as movimentações financeiras.
O governo buscou ainda reduzir a evasão fiscal, efetuar cortes nos repasses constitucionais a Estados e Municípios e privatizar empresas estatais, como siderúrgicas, petroquímicas e fertilizantes.
2. Criação da Unidade Real de Valor (URV)
A segunda etapa, assinada pelo presidente Itamar Franco em 27 de fevereiro de 1994, estabeleceu a utilização de uma moeda escritural chamada de Unidade Real de Valor (URV).
Essa nova moeda serviria como ligação para a conversão monetária entre a moeda vigente – o cruzeiro – e a nova moeda que entraria em circulação quatro meses depois – o Real.
Nesse sentido, a URV serviria como moeda para todas as transações econômicas, com conversão obrigatória de valores, promovendo uma desindexação geral da economia.
3. Transformação da URV em Real
Em 30 de junho de 1994, a terceira fase do Plano Real entrou em ação, com a edição da medida provisória que fixou a nova moeda.
Dessa forma, os cálculos e as conversões que eram realizadas através da URV foram trocados e em 1º de julho a nova moeda Brasileira, o Real, foi colocada em circulação.
Toda a base monetária brasileira foi alterada conforme a paridade legalmente estabelecida: CR$ 2.750,00 para cada R$ 1,00.
Plano real: 27 anos depois
O Plano Real marcou o fim da era de instabilidades monetárias e altas taxas de inflação, que bateram 5.000% entre julho de 1993 a junho de 1994.
A resposta à implantação do Real se deu de maneira quase instantânea.
Em junho de 1994, antes da moeda, o percentual mensal de inflação era de 46,58%. Um mês depois, a inflação registrada foi de 6,08%.
Com a inflação sob controle, a população ganhou poder de compra. De acordo com dados da Fundação Getúlio Vargas, em dois anos, a miséria no Brasil caiu 18%.
O frango se tornou um dos símbolos do Plano Real. Isso porque com apenas R$ 1, o consumidor conseguia comprar um quilo da ave.
As famosas maquininhas que remarcavam os preços nos supermercados, às vezes mais de uma vez ao dia, foram aposentadas já que os preços ganharam mais estabilidade.
Vale destacar ainda que após a implantação do Plano uma grande quantidade de reformas estruturais foram realizadas.
Entre as principais destacam-se a privatização de grandes estatais como a Vale, bem como a criação do Proer, para criar agências reguladoras, e a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Além disso, houve a renegociação das dívidas de estados e municípios, a maior abertura comercial com o exterior e a política de metas para a inflação.
Diante dos fatos podemos afirmar que, dado o nosso impressionante histórico inflacionário, o brasileiro hoje convive com uma inflação relativamente baixa. Na última década esse índice ultrapassou a marca de 10% anuais apenas uma vez, em 2015, quando chegou a bater em 10,71%.
Importante ressaltar ainda que, além de conseguir conter o avanço da inflação e reestruturar as bases da economia, o Plano Real também possibilitou feitos distributivos significativos.
Esse impacto foi sentido sobretudo em seus primeiros anos após a implementação, o que contribuiu sobremaneira para aumentar o poder de compra e reduzir os níveis de desigualdade social extremamente elevados à época.