O Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) não é tão conhecido pelo público em geral. No entanto, nesse momento de juros baixos, a modalidade tem chamado a atenção por causa da sua rentabilidade, normalmente mais alta do que outros investimentos de renda fixa.
Além disso, o FIDC é uma boa alternativa para quem busca diversificação da carteira. A seguir, saiba mais sobre esse investimento, e descubra quais as vantagens e desvantagens desses fundos.
O que é FIDC?
O FIDC é um fundo de investimento da categoria de renda fixa. Isso significa que, desde o início da aplicação, já é possível saber o seu rendimento.
Por definição, esse investimento precisa alocar, no mínimo, 50% dos recursos em direitos creditórios. O objetivo do FIDC é investir em direitos creditórios, normalmente originados do contas a receber de uma empresa. Ou seja, o patrimônio do fundo tem lastro em recebíveis de cartões de crédito, duplicatas, parcelamentos e demais formas de recebimentos que uma empresa comercial possui.
Um exemplo ajuda a entender o funcionamento e o propósito dos fundos de direitos creditórios: pense em uma rede de lojas que vende em até seis parcelas mensais. Possivelmente, em algumas ocasiões, ela precisará de caixa antes de receber a totalidade das vendas.
Se isso acontecer, uma das alternativas que o estabelecimento tem é vender os seus recebíveis para uma instituição financeira. Nesse caso, a venda dos créditos teria deságio, ou seja, a rede varejista receberia pelos recebíveis um valor inferior ao de face, por conta da antecipação dos recursos.
Após essa negociação, quando esses títulos forem pagos pelos clientes, quem receberá os recursos serão os investidores que adquiriram os recebíveis.
Perceba que a lógica do FIDC é bastante simples. No entanto, essa modalidade possui muitos detalhes e peculiaridades que precisam ser conhecidas pelos investidores. Continue a leitura, e entenda o que diferencia o FIDC de outros fundos de investimento.
Formas de constituição do FIDC
Em relação à constituição, o FIDC pode assumir o formato de condomínio aberto ou fechado, com prazo de duração determinado ou indeterminado. Vejamos cada uma dessas formas:
Condomínio aberto
Na modalidade condomínio aberto, é permitido o ingresso de novos cotistas. Além disso, os cotistas atuais podem aumentar as suas participações e realizarem o resgate total ou parcial de suas cotas. Normalmente, o FIDC de condomínio aberto tem prazo indeterminado de duração.
Condomínio fechado
Por outro lado, o FIDC de condomínio fechado não permite que cotistas entrem ou saiam quando se encerra o período de captação de recursos. Também não podem ser feitos novos aportes pelos novos cotistas, a não ser que se abram novas fases de investimento (rodadas de investimento).
Se algum cotista desejar vender antecipadamente as suas cotas, precisará negociá-las no mercado secundário de renda fixa. De forma geral, esse tipo de FIDC tem prazo determinado.
Tipos de cotas do FIDC
Uma das principais peculiaridades desse investimento é sua diversidade de categorias de cotas. Nesse sentido, elas podem ser de três tipos:
Cota sênior
A cota sênior concede ao detentor a preferência no recebimento de amortização e juros.
Esse tipo de cota possui remuneração prefixada. Isso significa que, mesmo que o fundo tenha rendimentos abaixo do previsto, o cotista sênior receberá o rendimento fixo. Por isso, é o tipo de cota mais procurado pelos investidores mais conservadores.
Cota subordinada preferencial (ou mezanino)
Esse tipo de cota carrega um risco intermediário entre as outras duas. Ou seja, possui prioridade de recebimento em relação às subordinadas, mas vem depois da cota sênior. Suas condições de negociação variam conforme cada FIDC.
Cota subordinada ordinária
Por fim, a cota subordinada ordinária receberá os rendimentos somente depois das duas anteriores. Dessa forma, esse tipo de cota é a que possui o maior risco de inadimplência entre as três.
No entanto, se a rentabilidade do fundo superar o retorno-alvo, o cotista sênior receberá a taxa prefixada. Nesse caso, as cotas mezanino e subordinada ordinária é que receberão os maiores rendimentos.
Estrutura do FIDC
Diferentemente dos outros fundos de investimento, o FIDC possui uma estrutura bem específica. Nesse sentido, existem cinco principais envolvidos na operação:
- cedente: é a empresa detentora dos direitos creditórios;
- estruturadores: é a instituição financeira ou o escritório jurídico responsável por montar todo o processo da operação;
- custodiante: é a instituição financeira que detém a guarda e o controle de todos os recebíveis que compõem o fundo;
- administrador: é quem faz a captação dos recursos do fundo e os gerencia;
- cotistas: são os investidores do FIDC.
Cedentes e tipos de recebíveis
Normalmente, esses fundos possuem um único cedente (empresa que cede os recebíveis). No entanto, também é permitido que sejam estruturados FIDCs com mais de um cedente.
Da mesma forma, é possível montar essas operações com diferentes tipos de direitos creditórios. Esses recebíveis são classificados em duas categorias:
Créditos performados: são aqueles nos quais a mercadoria já foi entregue ou o serviço já foi prestado. Em tese, esses recebíveis apresentam menor risco, pois o produto da negociação já foi entregue ao cliente.
Créditos não performados: nesse caso, o recebível já existe antes da contraprestação do produto ou serviço. Um contrato de fornecimento ou uma nota fiscal de venda para entrega futura são exemplos de créditos não performados. Pelo fato de ainda não ter ocorrido a entrega do produto ou serviço, esses recebíveis possuem mais risco do que os anteriores. Por isso, na hora de analisar um FIDC, é importante avaliar os tipos de recebíveis que formam o fundo.
Ainda em relação aos recebíveis, existe uma outra classificação: os FIDCs padronizados e os não padronizados.
Os padronizados deverão ter na carteira somente recebíveis de menor risco. É o que determina a instrução 356/01 da CVM. Por outro lado, conforme autorizado pela instrução 444/06, os não padronizados poderão conter créditos de maior risco. Veja alguns exemplos desses créditos:
- valores em recuperação judicial;
- valores em litígio judicial;
- precatórios;
- dívidas vencidas;
- valores de recebimento futuro ou incerto;
- derivativos.
Devido ao maior risco, a CVM determina que as cotas dos FIDCs não padronizados só poderão ser adquiridas por investidores institucionais. Ou seja, somente podem participar desses fundos investidores que comprovem aplicações financeiras superiores a R$ 10 milhões no mercado.
Rentabilidade do FIDC
Em relação à rentabilidade, os fundos de direitos creditórios podem ser prefixados ou pós-fixados. Quanto à taxa pós-fixada, ela pode ser definida como um percentual do CDI, ou acompanhar um índice de preços, como o IPCA ou o IGP-M, por exemplo.
Conforme vimos, o tipo de cota também influenciará nos ganhos do FIDC.
Custos do FIDC
Assim como todo fundo de investimento, o FIDC sofre a cobrança da taxa de administração e, em alguns casos, da taxa de performance.
Além disso, sobre os seus rendimentos incide o imposto de renda conforme a tabela regressiva das aplicações de renda fixa:
Prazo da aplicação | Alíquota IR |
Até 180 dias | 22,5% |
De 181 a 720 dias | 20% |
De 721 a 360 dias | 17,5% |
Acima de 720 dias | 15% |
Ademais do IR, há incidência do IOF regressivo para resgates com prazo inferior a 30 dias.
Vantagens dos FIDCs
Fora a diversificação da carteira, vejamos agora outras vantagens de investir nos fundos de investimento em direitos creditórios:
Rentabilidade do investimento
Conforme vimos, esses fundos possuem rentabilidade superior à média das aplicações de renda fixa. Por isso, podem ser uma boa alternativa para quem busca maiores ganhos mas deseja manter a previsibilidade dos rendimentos.
Classificação de risco
Obrigatoriamente, os FIDCs precisam ser avaliados por agências classificadoras de risco para que possam comercializar as suas cotas. Isso torna o investimento mais transparente para o cotista, que consegue ter acesso ao rating do fundo antes de optar pela aplicação.
Fomento à economia
Para o investidor, adquirir cotas de um FIDC é uma forma de financiar a economia do país. Nesse sentido, existem fundos de direitos creditórios dos mais variados segmentos, como logística, energia, infraestrutura, agronegócio, telecomunicações, entre outros.
Do ponto de vista das empresas, esse modelo favorece as suas demonstrações contábeis. Isso porque a venda dos recebíveis acaba “limpando” os balanços e melhorando a estrutura patrimonial. Isso facilita o acesso a novas operações de crédito.
Desvantagens do FIDC
Por outro lado, existem pontos menos favoráveis desse investimento que devem ser levados em consideração:
Restrições de acesso
Esses fundos são restritos a um público bem específico.
Nesse sentido, um dos requisitos exigidos para adquirir cotas de um FIDC é ser um profissional da área ou um investidor qualificado. No segundo caso, quem deseja investir deverá comprovar aplicações financeiras superiores a R$ 1 milhão.
Além disso, o valor inicial de investimento na modalidade é de R$ 25 mil, o que também limita o interesse de alguns investidores.
Baixa liquidez
Pelo fato de possuir essas restrições, a procura por esses fundos acaba sendo baixa se comparada a outras modalidades de investimentos. Dessa forma, a liquidez desse investimento costuma ser baixa.
Risco do investimento
Um dos fatores de risco do FIDC é a não cobertura do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), presente na maioria dos investimentos de renda fixa. Além disso, há o risco de crédito intrínseco à própria operação. Ou seja, se houver atrasos ou inadimplência, a rentabilidade do fundo será prejudicada.
Outro ponto importante a considerar é que, pelo fato de ser formado por recebíveis, o desempenho do FIDC tem relação direta com a performance da economia. Ou seja, quando a atividade econômica está aquecida, há mais dinheiro em circulação e, consequentemente, mais consumo.
Por outro lado, em tempos recessivos, o consumidor deixa de comprar e, na pior das hipóteses, atrasa compromissos financeiros. Como vimos, isso impacta negativamente a rentabilidade do fundo.
Alterações nas regras dos fundos de direitos creditórios
É possível que, em breve, tenhamos algumas novidades em relação aos fundos de direitos creditórios. Isso porque, no final do ano passado, a CVM abriu audiência pública para modernizar as regras dos fundos de investimentos e dos FIDCs.
No caso dos FIDCs, uma das alterações importantes que estão sendo avaliadas é o acesso do público geral ao investimento. Para isso, serão necessárias algumas modificações no atual processo. Uma delas é a exigência de maior clareza em relação às responsabilidades dos prestadores de serviços do fundo.
Outro ponto sugerido pela CVM é a obrigatoriedade de registrar os direitos creditórios em entidade autorizada pelo Banco Central.
Por fim, o projeto estuda também a criação de FIDCs socioambientais. Segundo o edital da CVM, isso é para incentivar os gestores desses fundos a buscarem projetos que promovam o desenvolvimento socioambiental.
Considerações finais sobre o FIDC
Em tempos de juros baixos, os FIDCs podem ser uma boa alternativa de diversificação com rentabilidade entre as modalidades de renda fixa. No entanto, trata-se de um investimento com diversas peculiaridades, o que torna mais complexas a sua operacionalização e compreensão.
Há também pontos que merecem bastante atenção, como o risco de performance dos recebíveis. Como vimos, normalmente esses fundos são compostos por recebíveis comerciais, ou seja, o seu desempenho está diretamente ligado à atividade econômica. Logo, fatores como inflação e crise financeira tendem a impactar diretamente os ganhos da aplicação.
Os recebíveis que formam o fundo são outro fator importante a ser analisado. Nesse sentido, fundos não padronizados são os que costumam oferecer os melhores rendimentos. Porém, oferecem risco consideravelmente superior aos padronizados, o que também deve ser levado em consideração na hora de analisar o investimento.
Por fim, as recentes alterações em estudo pela CVM tendem a popularizar a aplicação. Segundo Marcelo Barbosa, presidente da CVM, o regime dos FIDCs já necessitava de uma atualização. Para Barbosa “o produto tem grande potencial e, com algumas alterações, poderá voltar ao nível de crescimento de anos anteriores.”