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É confisco? Entenda a polêmica da apropriação do dinheiro esquecido pelo governo

É confisco? Entenda a polêmica da apropriação do dinheiro esquecido pelo governo

Na última semana, a incorporação de cerca de R$ 8,56 bilhões de dinheiro esquecido no sistema financeiro às contas do Tesouro Nacional gerou um debate no Brasil sobre a natureza dessa ação. Seria essa transferência um confisco?

A Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) rapidamente se pronunciou, afirmando, na última sexta-feira (13), que não se trata de confisco, procurando evitar qualquer pânico a respeito.

Mas, afinal, o que está acontecendo e por que esse movimento não é considerado uma expropriação dos recursos? E mais: qual o risco de realmente haver um confisco?

Confisco? Por que o dinheiro esquecido será transferido?

O montante refere-se a recursos esquecidos por correntistas em contas bancárias ou investimentos não movimentados. O valor será transferido para o Tesouro Nacional como parte de uma medida para compensar a prorrogação da desoneração da folha de pagamento de setores da economia, aprovada pela Câmara dos Deputados em 12 de setembro.

A medida prevê que esses R$ 8,56 bilhões ajudem a compor os R$ 55 bilhões necessários para cobrir a extensão do benefício fiscal.

Como vai funcionar?

Quando o dinheiro passar para os cofres públicos, o Ministério da Fazenda terá que publicar um edital, no Diário Oficial da União, com a relação de todos os valores recolhidos, e essa lista deverá conter a instituição onde o dinheiro está, a agência e o número da conta bancária. A partir da publicação desse edital, quem ainda tiver valores nessa lista terá 30 dias para contestar e pedir o dinheiro de volta.

Caso a contestação da pessoa física ou da empresa seja negada, será possível apresentar recurso ao Conselho Monetário Nacional (CMN) no prazo de dez dias. Se não houver contestação no prazo, a transferência será concluída para o Tesouro.

Apesar disso, ainda será possível pedir os valores por meio de ação judicial em até seis meses, que serão contados a partir da publicação do edital do Ministério da Fazenda.

Os valores que já foram para o Tesouro poderão ser solicitados diretamente às instituições financeiras até o dia 31 de dezembro de 2027.

O que é considerado dinheiro esquecido?

São considerados dinheiro esquecido:

  • Contas correntes ou poupança encerradas com saldo disponível;
  • Tarifas cobradas indevidamente, desde que previstas em Termos de Compromisso assinados pelo banco com o Banco Central;
  • Parcelas ou obrigações relativas a operações de crédito cobradas indevidamente, desde que previstas em Termos de Compromisso assinados pelo banco com o BC
  • Cotas de capital e rateio de sobras líquidas de beneficiários de cooperativas de crédito;
  • Recursos não procurados de grupos de consórcio encerrados.

Não é confisco, diz o governo

A Secom foi rápida ao refutar que a ação se assemelhe a um confisco, como o ocorrido no início dos anos 1990, durante o governo de Fernando Collor. Naquela ocasião, houve uma verdadeira expropriação de poupanças, quando o governo congelou as contas de milhares de brasileiros como parte de um plano de combate à inflação, impedindo os cidadãos de acessarem seus próprios recursos por meses, o que resultou em grandes perdas financeiras.

Diferentemente do confisco de Collor, o governo atual garante que os cidadãos poderão solicitar a devolução do dinheiro esquecido mesmo após sua incorporação ao Tesouro.

Ou seja, quem tiver direito a esses valores poderá resgatar o montante mesmo após incorporado pelo governo. A Secom cita ainda a Lei 2.313, de 1954, que já prevê há mais de 70 anos a possibilidade de o governo absorver valores que estejam há anos parados no sistema financeiro. Portanto, não se trataria de uma nova legislação criada para o cenário atual.

“Conforme o estado aumenta, ele vai avançando sobre os bens de quem o sustenta, ou seja, os trabalhadores e a iniciativa privada. Isso já ocorre via impostos, inflação, emissão de dívida… tudo isso pode ser interpretado como confisco dos bens. Essa medida é mais do mesmo”, pondera Denys Wiese, estrategista da EQI Investimentos.

“É ruim? É. Mas é o Brasil sendo Brasil. Não é algo novo que a gente tenha que se preocupar. O que a gente tem que se preocupar sempre é com o tamanho do estado”, complementa.

Memória do confisco de Collor

Para muitos brasileiros, a simples menção à palavra confisco traz lembranças difíceis. Em 1990, o governo confiscou parte das poupanças e das contas correntes de milhões de pessoas, permitindo o saque de apenas uma parcela mínima dos saldos.

A medida fez parte do chamado Plano Collor, que foi um conjunto de medidas econômicas implementado com o objetivo de controlar a hiperinflação no Brasil. Ele foi marcado por ações drásticas, como o confisco temporário de poupanças e contas correntes e congelamento de preços e salários.

O principal e mais polêmico ponto foi o bloqueio de grande parte do dinheiro da população por 18 meses, o que gerou muita insatisfação e instabilidade econômica. Embora a inflação tenha sido reduzida inicialmente, o plano não teve sucesso sustentável a longo prazo e resultou em recessão econômica.

Hoje, confisco não faria sentido, diz Juliano Custodio, CEO da EQI

Embora o atual governo afirme que a incorporação do dinheiro esquecido não é comparável ao episódio Collor, a memória de intervenções passadas ainda pesa sobre a percepção pública, especialmente entre os que viveram o confisco.

“O confisco do Collor visava diminuir a inflação, tirando dinheiro da rua. Bloquearam o dinheiro da poupança e da conta corrente. Hoje em dia não é mais preciso fazer isso. O governo confisca seu dinheiro via inflação. Para se financiar, o governo emite título da dívida. Para tirar dinheiro da economia, ele vende título público que remunera bem, as pessoas compram, param de gastar, a inflação automaticamente cai. Mas, por que na época não faziam isso? Por que a insegurança era muito grande. Hoje você tem credibilidade”, confirma Juliano Custodio, CEO da EQI.

E complementa: “Não concordo com a questão dos valores esquecidos irem para o governo, mas a população precisa se tranquilizar que um confisco como o dos anos 90 não vai acontecer”, aponta.

Divergências sobre o impacto fiscal

A polêmica do dinheiro esquecido, no entanto, não para na natureza jurídica da medida.

O Banco Central (BC) e o Ministério da Fazenda discordam sobre como contabilizar os recursos esquecidos. O BC argumenta que, por serem valores originários de correntistas e não fruto de arrecadação ou economia do governo, não representam esforço fiscal. Já o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defende que esses valores podem ser incluídos na meta de déficit primário zero para 2024, baseando-se em precedentes como o caso dos R$ 26,3 bilhões do fundo PIS/Pasep transferidos para o Tesouro no final de 2022.

Essa divergência entre BC e Fazenda cria uma das maiores discussões estatísticas entre os dois órgãos na história recente. A Fazenda contabiliza os recursos como parte da meta fiscal, enquanto o BC discorda, tornando o cenário fiscal mais nebuloso.

Quais outros países já realizaram confisco?

Não foi apenas o Brasil de Fernando Collor que realizou o confisco de dinheiro. Confira, abaixo, outras nações que já tomaram medidas semelhantes – e confiscaram até mesmo ouro:

  • Chipre (2013): Em março de 2013, o Chipre enfrentava uma crise bancária. Para evitar o colapso do Bank of Cyprus, o governo fechou os bancos e confiscou 30% das contas com mais de 100 mil euros. Alguns cidadãos evitaram o confisco usando Bitcoin, a primeira vez que a criptomoeda foi utilizada como proteção financeira em uma crise.
  • Corralito (Argentina, 2002): Em 2001, o governo argentino congelou todas as contas bancárias, limitando saques e proibindo retiradas em dólares. Em 2002, os depósitos em dólares foram convertidos à força em pesos, gerando perdas para a população. Esses eventos resultaram em protestos e deixaram os argentinos desconfiados dos bancos, incentivando o uso de criptomoedas no país.
  • Líbano (2019): O Líbano enfrentou uma grave crise bancária em 2019, com desvalorização da moeda e proibição de saques em dólares. A libra libanesa sofreu forte queda, e a inflação disparou. A crise levou ao fechamento de vários comércios e ao calote da dívida em 2020, causando grande instabilidade econômica.
  • Estados Unidos (1933): Em 1933, os EUA confiscaram o ouro dos cidadãos através da Ordem Executiva 6102, pagando um valor fixo por onça-troy. Após o confisco, o governo desvalorizou o dólar, elevando o preço do ouro e resultando em perdas indiretas para os americanos. A posse de ouro foi proibida até 1975.

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