A permanência da Selic em níveis elevados encareceu os financiamentos, mudando o cenário do crédito no país: bancos estão mais criteriosos, priorizando clientes de renda mais alta e afastando parte significativa da população de financiamentos tradicionais. Para muitos brasileiros, o consórcio se tornou a principal porta de entrada para adquirir um imóvel ou veículo, mas será que essa é a melhor opção com a Selic em alta?
Cauê Ostetto, Head de Consórcios da EQI Investimentos, observa que esse movimento já reflete nos números.
“Com o crédito “mais caro”, as instituições buscaram clientes com perfil de renda maior. Isso fez com que o consórcio ganhasse força entre os consumidores que buscam alternativas mais acessíveis para realizar seus objetivos.”
Segundo ele, o modelo cresceu 19,7% entre janeiro e maio de 2025 em comparação com o mesmo período de 2024 — um salto puxado tanto pelo volume financeiro quanto pela quantidade de cotas comercializadas.
O crescimento dos consórcios não é pontual.
Em 2025, o setor bateu recordes históricos: mais de 2,07 milhões de cotas foram vendidas nos primeiros cinco meses do ano, movimentando R$ 186 bilhões. Sendo este o maior volume dos últimos 20 anos, segundo Ostetto. Em maio, o número de participantes ativos chegou a 11,73 milhões.
Entre os segmentos, os imóveis lideram em volume financeiro, com 44,7% das vendas. No entanto, em número de contemplações, os consórcios de veículos leves foram destaque com 308 mil contemplados — mostrando que, mesmo em um cenário de Selic alta, o consumidor continua comprando, mas de forma mais planejada.
“O que surpreende também é o numero de participantes ativos, 11,73 milhões em maio, a quantidade de cotas contempladas no ano é de 722 mil, com R$ 47 bilhões de créditos disponibilizados”, comenta.
O segmento de veículos leves representou 15% das vendas, quando falamos de contemplações, tivemos 308 mil, liderando o ranking Já os imóveis, representaram 44,7% das vendas,, com 55 mil contemplados em 2025.
Consórcio é mais barato?
Para quem compara o custo total de aquisição, a diferença é gritante. Segundo Cauê, o consórcio pode ser até 50% mais barato que um financiamento tradicional, considerando taxas, encargos e correções. O motivo? Enquanto o financiamento embute juros elevados nas parcelas, o consórcio opera com uma taxa de administração pré-definida e estável ao longo do contrato.
Mesmo com a Selic oscilando entre extremos, o consórcio mantém sua taxa de administração praticamente inalterada. “São modalidades diferentes, o consórcio com o custo mais barato e como estratégia de planejamento e o financiamento é mais caro, mas para uma opção de compra a curto prazo”, reforça Ostetto. Isso garante previsibilidade e menor impacto no orçamento do consumidor.
Tem pressa? Existem estratégias para acelerar a contemplação
Quem deseja acesso rápido ao bem precisa entender que o consórcio exige planejamento. Contudo, há alternativas para antecipar a contemplação, como os lances. Segundo Ostetto, “os lances são uma maneira eficiente de receber o crédito antes do sorteio. Mesmo que o cliente não precise desembolsar o valor no momento do lance, ele já pode ser contemplado se o valor oferecido for suficiente.”
Para quem já possui alguma reserva, essa é uma grande vantagem. “Quem já possui recursos poupados, consegue ofertar lances livres para acelerar o recebimento do crédito”, explica o especialista. Além disso, a escolha do grupo e da administradora faz toda a diferença: grupos mais equilibrados e com bom histórico de contemplações aumentam as chances de sucesso.
Lances altos, inadimplência estável: os impactos indiretos da Selic
Mesmo que a Selic não interfira diretamente nas taxas do consórcio, seus efeitos indiretos são sentidos. “Com o financiamento mais caro, os lances nos consórcios também subiram. Quem quer o crédito com mais rapidez precisa estar disposto a investir mais no lance”, alerta Cauê Ostetto.
Apesar desse aumento nos lances, não houve crescimento da inadimplência.
“Com o custo do dinheiro mais caro no financiamento, os lances nos consórcios também subiram, fazendo com que o cliente que busca o crédito a curto prazo, precise descapitalizar mais para ter acesso ao recurso. E mesmo em um cenário de juros altos, não há registro quanto ao aumento da inadimplência”, diz o especialista, reforçando a solidez da modalidade frente às turbulências macroeconômicas.
FGTS no consórcio: sim, é possível
Uma das perguntas mais comuns é se o FGTS pode ser usado no consórcio de imóveis — e a resposta é sim. Segundo Ostetto, o fundo pode ser usado tanto como lance quanto para amortizar o saldo devedor.
“Porém, para isso é necessário obedecer as regras estabelecidas. O imóvel não pode ter avaliação de mercado superior a R$ 1,5 milhão e deve ser o único imóvel na cidade que reside ou trabalha.”
Só em 2025, mais de R$ 123 milhões foram usados por consorciados por meio do FGTS. Foram mais de 1.600 pessoas beneficiadas, demonstrando como o consórcio consegue se encaixar até mesmo nas políticas de habitação e programas de incentivo à moradia.
Expectativa x realidade: o erro de quem entra no consórcio
Um dos maiores motivos de frustração — e cancelamentos — é a expectativa equivocada de que o consórcio é uma forma de crédito rápido.
“Por ser um instrumento de auxilio no planejamento para a aquisição, precisamos entender que o consórcio é um meio de adquirir um novo bem, de forma mais acessível que as modalidades tradicionais”, afirma Ostetto. Ele destaca que o consórcio é, antes de tudo, uma estratégia de planejamento.
Consórcio acompanha a valorização dos bens e protege o poder de compra
Com os imóveis e veículos se valorizando, os valores das cartas de crédito também aumentaram. Isso ocorre porque os créditos são atualizados por índices como INCC (para imóveis) e FIPE ou IPCA (para veículos) ganhando valorização. “Isso protege o poder de compra do consorciado”, explica Cauê Ostetto.
Assim, mesmo em um cenário inflacionário, o consórcio preserva o valor investido. Além disso, há flexibilidade: o valor da carta pode ser usado para diferentes finalidades, desde que respeite a natureza do bem — um diferencial importante em relação ao financiamento tradicional.
Perfil dos consorciados vem mudando
Com o avanço digital, o consórcio deixou de ser uma modalidade burocrática e ganhou agilidade. “Hoje, tudo pode ser feito com processos mais ágeis, rápidos e simples. Em todas as etapas do processo, desde a contratação até a liberação dos recursos para a compra do bem”, diz Ostetto.
Segundo o especialista, o consórcio é um dos instrumentos de crédito mais democráticos do mercado. O público mais ativo está na faixa dos 30 aos 50 anos, mas há participantes entre 18 e 70 anos. “Há quem busque a compra do primeiro carro, a troca de imóvel, a renovação da frota ou o sonho da casa na praia.”
Estável em meio à instabilidade
Mesmo em tempos de juros altos, crise fiscal e incertezas econômicas, o consórcio segue crescendo. “É uma modalidade que nasceu no Brasil na década de 1960 e passou pela Selic a 2% e também por juros acima dos 20% ao ano. Com a regulamentação da Lei 11.795/2008, ganhou ainda mais segurança e credibilidade”, destaca Cauê Ostetto.
Para ele, a tendência é de crescimento contínuo. Enquanto o financiamento se torna inviável para muitas famílias, “o consórcio é a forma de crédito mais barata e acessível ao público, possibilitando o planejamento na aquisição. Essa modalidade continuará crescendo nos próximos anos, se reinventando e modernizando para melhor atender aos brasileiros.”
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