Apesar de um início complicado com a variante ômicron do coronavírus e a instabilidade política provocada pelas eleições, o ano de 2022 foi considerado positivo para o mercado imobiliário. Segundo os dados da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (ABRAINC), nos 11 primeiros meses do ano passado, mais de 146 mil imóveis novos foram vendidos em todo o Brasil, um crescimento de 12,2% em relação ao ano anterior. Inclusive este número bateu o recorde da série histórica.
Estes números trouxeram otimismo para os empresários do mercado imobiliário. No final de 2022, outra pesquisa da ABRAINC revelou que 62% dos empreendedores acreditam que o ano de 2023 poderia ser melhor do que o ano passado.
Contudo, uma série de fatores mudaram a percepção dos analistas, que estão mais pessimistas neste momento. Mas o que será que aconteceu? O portal EuQueroInvestir atualiza as expectativas para o mercado imobiliário em 2023 e faz uma entrevista exclusiva com Lucas Daniel, analista da EQI Research, para explicar a situação atual da construção civil.
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Deterioração do mercado imobiliário
Em 2023, algumas nuvens apareceram no céu de brigadeiro do mercado imobiliário. O Índice de Confiança da Construção (ICST), do FGV IBRE, que mede o nível de confiança da construção civil, está em queda livre desde o mês de setembro de 2022.
No ICST de março, o indicador se manteve em 94,4 pontos, pontuação considerada de moderado pessimismo. Nas médias móveis trimestrais, o índice caiu 0,3 ponto.
De acordo com a coordenadora de projetos da construção do FGV-Ibre, Ana Maria Castelo, apesar da melhora na perspectiva de demanda, a percepção mais negativa sobre a tendência do ambiente de negócios contaminou os dados e o manteve no patamar de pessimismo.
Mas o que provocou esse pessimismo? Para parte do mercado imobiliário, uma razão explica este sentimento: a alta de juros.
Empresários reclamam de juros altos
Em entrevista ao site NeoFeed, o CEO da MRV (MRVE3), Rubens Menin, fez uma dura crítica ao modo como o Brasil enfrenta a questão dos juros.
“Em 1994, fizemos um pacto social. O Plano Real foi um pacto social. Mas nunca se pensou nos juros, só na moeda, na inflação. Acho que fomos muito lenientes no Brasil em relação aos juros. Com isso, de fato, nunca atacamos o problema de frente. (…) o Brasil tem um potencial enorme, é um país continental. Só que ele esqueceu dos juros. Não consegue ter crescimento sem ter juros baixos”, explica.
O empresário comentou que o recuo da taxa de juros para 2% em 2020 foi um erro. “Depois que passou é fácil falar, mas hoje está claro que foi errado. Mas o pior é que todo mundo acreditou naquilo e os investimentos começaram a ser feitos com taxa de 2% ao ano. E, mais uma vez, o Brasil sendo sempre o Brasil, foi o país que subiu de 2% para 13,75% mais rápido no mundo. E as pessoas dizendo: ‘foi muito bom porque acabamos com a inflação mais rápido”, relata.
Na avaliação de Menin, este movimento trouxe efeitos catastróficos com a velocidade em que ele foi aplicado e que agora “as famílias estão devendo, as empresas, o próprio país”.
Menin aponta que a solução da questão dos juros é formular um pacto na sociedade sobre o tema. “Me incomoda muito essa conversa unilateral de ‘ah, meu objetivo é a inflação’. Não, o objetivo tem de ser inflação e juros”, desabafa.
Apesar dessa crítica, Menin cita que é preciso que o país avance na Reforma Tributária, no arcabouço fiscal e no pacote de bondade para a população mais carente. Porém, essas medidas são palatáveis apenas se houver aquele pacto com a questão dos juros.
O presidente da ABRAINC, Luiz Antonio França, durante um encontro com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o novo arcabouço fiscal e a reforma tributária são importantes para abrir espaço para o corte de juros.
“O novo regime fiscal é fundamental para o Brasil. Este está sendo trabalhado pelo Ministério da Fazenda e será enviado ao Congresso. É muito importante que o Congresso tramite rapidamente para que, com esse novo arcabouço fiscal, tenhamos condições de redução da taxa de juros no Brasil. Hoje, a taxa de juros para as empresas do Brasil está ficando proibitiva. Portanto, temos todas as condições de rapidamente melhorar o ambiente de negócios brasileiro”, declarou.
França ressalta que o mercado imobiliário representa 10% da força de trabalho, 9% da arrecadação de tributos e 7% do PIB brasileiro.
Expectativa com o Minha Casa, Minha Vida e outros programas habitacionais
Se há pessimismo generalizado com o mercado imobiliário, os programas habitacionais, como o “Minha Casa, Minha Vida” podem arrefecer a crise de oferta e demanda.
Em agosto do ano passado, o então presidente Jair Bolsonaro reduziu a taxa de juros do financiamento dos imóveis do “Casa Verde e Amarela” de 8,66% para 7,66% ao ano para imóveis de até R$ 350 mil e de 8,66% para 8,16% ao ano para imóveis acima de R$ 350 mil.
Além disso, o ex-presidente aumentou o prazo de financiamento para 35 anos e ampliou a renda máxima dos beneficiários para R$ 8 mil.
As mudanças já tiveram um efeito, praticamente imediato, com o mercado imobiliário aumentando a oferta de lançamentos no 4TRI22 em 42%, segundo a Abrainc.
Após as eleições, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) salientou que o governo federal iria focar em programas sociais, sendo que um dos focos seria a recriação do “Minha Casa, Minha Vida”.
O programa habitacional foi revitalizado. Ele manteve os benefícios concedidos durante o governo Bolsonaro e ainda direcionou maiores investimentos nas duas primeiras faixas de renda, com famílias que possuem renda familiar de até R$ 4,4 mil.
Em 2022, os imóveis populares foram responsáveis por 70,2% das moradias vendidas no Brasil, com 91.924 moradias comercializadas.
Outro programa habitacional que pode aumentar o número de lançamentos imobiliários é o “Pode Entrar” da Prefeitura de São Paulo, que tem a expectativa de entregar mais de 20 mil unidades habitacionais, com um investimento de mais de R$ 4 bilhões.
De acordo com o edital do programa, ele oferece a oportunidade de comprar um imóvel novo com a facilidade de aprovar um financiamento por até 30 anos e com parcelas de R$ 150 até R$ 594, a depender da renda familiar.
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Entenda o cenário do mercado imobiliário com o analista da EQI Research
Para entender de uma vez a expectativa do mercado imobiliário em 2023, o portal EuQueroInvestir conversou com Lucas Daniel, analista da EQI Research.
O especialista comentou desde a deterioração do cenário macroeconômico até a influência dos programas habitacionais no mercado imobiliário.
Portal EuQueroInvestir: O ano de 2022 foi considerado positivo para o setor imobiliário, com um crescimento de quase 12% durante os meses de janeiro a outubro. Diante disso, uma pesquisa da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) revela que mais de 60% dos empresários do setor avaliam que o ano de 2023 será melhor que o do ano passado.
Contudo, nos últimos meses, percebemos uma deterioração para o setor que é possível ser observado com a redução no Índice de Confiança da Construção (ICST), do FGV-Ibre.
Quais são os fatores que sustentam essa mudança de humor do mercado?
Lucas Daniel: O atual cenário de incertezas fiscais e aumento dos gastos públicos deteriorou as expectativas do setor nos últimos meses. A perspectiva de juros elevados por um período mais prolongado impacta negativamente na demanda do setor, visto que os custos de financiamento aumentam para os consumidores.
A desaceleração econômica também aumenta a incerteza dos consumidores, que não se sentem seguros de adquirir imóveis no atual cenário.
Olhando para as construtoras, essas acumularam grande estoque de imóveis durante momentos mais otimistas, aumentando a oferta de imóveis, e agora com um cenário de menor demanda, devemos observar os impactos nos preços das unidades.
EuQueroInvestir: Em agosto do ano passado, o então presidente Jair Bolsonaro reduziu a taxa de juros do financiamento dos imóveis do antigo “Casa Verde e Amarela” 8,66% para 7,66% ao ano para imóveis de até R$ 350 mil e 8,66% para 8,16% ao ano para imóveis acima de R$ 350 mil. Além disso, o ex-presidente aumentou o prazo de financiamento para 35 anos e ampliou a renda máxima dos beneficiários para R$ 8 mil.
Mesmo com a troca de governo, o programa habitacional segue em foco. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva rebatizou o “Casa Verde e Amarela” para “Minha Casa, Minha Vida”, com preferência para as duas primeiras faixas de renda, que são os cidadãos que recebem até R$ 4,4 mil. Estes imóveis já são responsáveis por cerca de 70% das vendas de imóveis novos no Brasil, segundo a Abrainc.
Ademais, a prefeitura de São Paulo lançou um novo programa habitacional, o Pode Entrar, destinado para moradias populares. Ele poderá provocar mais um crescimento do setor imobiliário na maior cidade do país.
Dito tudo isso, como os programas habitacionais podem ajudar no desenvolvimento do setor imobiliário?
Lucas Daniel: Os programas de habitação social vêm se mostrando um bom instrumento para aumentar a popularidade dos governos, então acreditamos que seja natural o atual governo manter, ou até ampliar os benefícios desses programas.
No setor da construção popular, que enfrentou dificuldades nos últimos anos para repassar a inflação dos custos dos materiais de construção nos preços dos imóveis, os programas sociais elevam o poder de financiamento das famílias de baixa renda, viabilizando novos empreendimentos para as construtoras.
No contexto do programa “Pode Entrar”, a prefeitura de São Paulo deve adquirir cerca de 40 mil imóveis populares. Esse programa surge em um momento em que muitas construtoras populares possuem altos estoques de imóveis, que quando vendidos, em sua maioria, apresentam descontos em relação ao valor de mercado. As vantagens para as construtoras envolvem economia em despesas de corretagem e marketing, além de reduzir o nível de estoque de imóveis não vendidos.
EuQueroInvestir: Rubens Menin, CEO da MRV, criticou, recentemente, a alta taxa de juros. Ele comentou que não é possível crescer com uma taxa tão alta nos juros. Luiz Antonio França, presidente da Abrainc, cobrou do governo federal uma sinalização para o arcabouço fiscal e uma reforma tributária para abrir espaço para o corte de juros.
Pensando nisso, como os juros altos dificultam a vida do setor imobiliário?
Lucas Daniel: Apesar do ano de 2022 acima das expectativas, o mercado já começa a demonstrar o impacto da elevada taxa de juros e, consequentemente, da desaceleração econômica. A elevação da taxa de juros aumenta o custo de financiamento imobiliário, e torna a aquisição do imóvel menos acessível para as famílias. Nos últimos meses, observamos o crescimento de 4 p.p., em média, das taxas de financiamento dos principais bancos.
A desaceleração econômica também diminui a confiança do consumidor na aquisição de um imóvel, assim devemos observar queda na demanda no setor, e consequentemente as construtoras reduzindo o volume de lançamentos para 2023.
EuQueroInvestir: Quais são as construtoras mais expostas ao cenário atual?
Lucas Daniel: Em modo geral, o setor de construção civil é muito ligado na parte macroeconômica, independentemente de boa execução ou de estratégia, todas estão expostas.
O que pode acontecer é que as construtoras populares terão incentivos por conta dos programas populares de habitação. Vão dar uma impulsionada nas vendas, ainda que elas sejam artificiais.
A gente gosta muito de olhar as construtoras pela qualidade dela, pelo o que elas têm entregado nos últimos trimestres. Nós [da EQI Research] preferimos construtoras que tiveram uma boa execução, histórico bom de lançamentos comparado com as vendas, carregam menos estoques, estão menos endividadas e tendem a performar melhor durante este período.
Para falar alguns nomes, as preferências de construtoras de alta e média renda são a Cyrela (CYRE3) e a Lavvi (LAVV3); enquanto que as construtoras populares a gente gosta da Direcional (DIRR3) e da Cury (CURY3).
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