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Shutdown: Ruído político ou ameaça econômica? 

Shutdown: Ruído político ou ameaça econômica? 

Na madrugada dessa terça para quarta-feira, testemunhamos a paralisação do governo americano — o famoso Shutdown.

Eventos como esse já ocorreram diversas vezes na história política norte-americana. Na maioria dos casos anteriores, tais paralisações traziam consigo uma ameaça assustadora aos mercados: a possibilidade de o caixa do Tesouro dos EUA ficar “zerado”, culminando em um default da dívida americana.

Desta vez, esse risco não existe — e isso faz toda a diferença. Explico em mais detalhes abaixo.

O significado do Shutdown atual

O Shutdown em curso representa mais um ruído político do que uma ameaça econômica imediata. Para alguns analistas, trata-se de uma batalha de vida ou morte política para o senador democrata Chuck Schumer, líder do partido no Senado. Não é de hoje que os democratas buscam uma oportunidade de enfrentar Donald Trump.

No primeiro semestre, cogitou-se um Shutdown justamente quando o teto da dívida estava em pauta. Naquela ocasião, os democratas consideraram que o momento não era favorável: tanto Wall Street quanto Main Street viviam uma espécie de “lua de mel” com o recém-eleito Trump. Aproveitando-se disso, o governo conseguiu elevar o teto do endividamento e recapitalizar o Tesouro, que se encontrava em zona perigosa.

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A conta do Tesouro e o caixa confortável

Por algum tempo, a conta TGA (Treasury General Account) chegou a ficar abaixo de US$ 300 bilhões — um patamar considerado baixo. Nos últimos dois meses, entretanto, ela foi recapitalizada, ultrapassando US$ 800 bilhões, nível visto como confortável.

Assim, diferentemente do passado, o Shutdown atual não traz risco imediato a Wall Street, mas sim um embate político de longo alcance.

Uma batalha pelo futuro político

Esse confronto se conecta diretamente às eleições de midterm de 2026, envolvendo instituições centrais como a Suprema Corte, o Federal Reserve e outras. As consequências podem impactar tanto o valor relativo do dólar quanto os mercados de ações.

Trump, acostumado ao confronto, segue a cartilha aprendida com o advogado Roy Cohn:

Ataque, ataque, ataque – sempre na ofensiva, dominando os oponentes pela força.

Não admita nada, negue tudo – negue erros ou acusações, mesmo diante de evidências.

Proclame vitória, nunca admita derrota – a imagem de sucesso é mais importante que a realidade.

Não surpreende, portanto, que Trump esteja partindo para o ataque. Seu governo já congelou bilhões de dólares em gastos ligados a projetos de clima e infraestrutura em estados democratas.

Os democratas, por sua vez, resistem em manter créditos tributários do ObamaCare, que subsidiam despesas de usuários do sistema. Como os republicanos contam com apenas 53 votos no Senado (de um mínimo necessário de 60), precisam vencer essa batalha de persuasão.

Lições da história e os riscos atuais

Historicamente, os Shutdowns mais longos foram:

2013: 16 dias

2018–2019: 35 dias, o mais longo da história.

Quanto mais prolongado, maior o desgaste político. Relatórios econômicos deixam de ser divulgados, servidores são dispensados (furlough), e cresce a pressão sobre os partidos.

Por trás dos bastidores, Schumer não deseja ceder espaço para a ala radical democrata liderada por Alexandria Ocasio-Cortez. Já os republicanos veem no impasse uma oportunidade de enfraquecer os democratas e consolidar maioria em 2026.

Repercussões globais e o dólar

O pano de fundo internacional é crucial. Dados da BEA (29/9) mostram que a posição internacional líquida dos EUA (NIIP) está em -US$ 26 trilhões. Ou seja, investidores globais possuem US$ 26 trilhões a mais em ativos americanos do que os EUA possuem no exterior.

Um Trump fortalecido pode manter a atratividade do dólar​ e dos ativos norte-americanos (S&P 500), usando tarifas e geopolítica como armas. Já um Trump enfraquecido, diante de um Schumer energizado, pode se tornar semelhante ao debilitado Macron, que perdeu quatro primeiros-ministros em poucos anos.

​Não quero aqui afirmar que uma vitória republicana irá resultar em um dólar mais forte. Neste momento, há fortes indícios de que um “dólar mais fraco” é do interesse de Trump e de seu Secretário Scott Bessent. O que está em jogo, na minha opinião, é a atratividade dos EUA como oportunidade de investimentos e porto seguro. 

Impacto nos mercados e possível contágio social

No curto prazo, a resiliência dos mercados de ações parece razoável. O risco está em uma escalada política que envolva também a Main Street. Manifestações como os Coletes Amarelos na França (2018) ou o​ recente movimento Block Everything ​(também na França) podem inspirar protestos em cidades americanas alinhadas aos democratas.

Vale lembrar: mais de 80% das famílias com renda acima de US$ 100 mil têm exposição direta ou indireta a ações e ETFs. Interromper essa “festa” pode custar caro politicamente.

Conclusão: o Shutdown atual não ameaça o caixa do Tesouro, mas é peça-chave em uma batalha política de longo prazo. Mais do que números fiscais, está em jogo a correlação de forças entre republicanos e democratas — e o futuro do dólar​ e da bolsa nos mercados globais.