Com a decisão da Caoa Chery de demitir 485 pessoas e manter a fábrica de Jacareí (SP) fechada até 2025, voltou-se a discutir a crise que o setor automotivo enfrenta desde o início da pandemia, com a escassez de produtos, a falta de semicondutores e de peças essenciais para que a produção volte à normalidade.
Em meio a fechamento de fábricas e demissões, o segmento foi um dos mais prejudicados pela pandemia de coronavírus e mesmo com a campanha vacinal, ele sofre para se recuperar e voltar para os mesmos patamares de 2019.
Além da importação ter sido encarecida ao longo do cenário pandêmico, um outro problema que agravou a crise no setor foi a falta de peças e componentes eletrônicos em suas linhas de produção.
Indústria apresenta leve melhora
A indústria começou a apresentar resultados mais satisfatórios este ano, com a melhora de oferta de semicondutores e de chips eletrônicos para equipar veículos, no entanto, a situação está longe do ideal. Em 2022, 1,25 milhão de carros deixarão de ser fabricados por causa da escassez no componente, de acordo com a Auto Forecast Solutions (AFS).
Com base nas projeções para a evolução do problema e nos volumes já estimados pelas montadoras, a fabricação de 527 mil veículos deve ser afetada pela falta de peças. De acordo com o relatório da empresa, divulgado em fevereiro de 2022, no momento, 423 fábricas ao redor do mundo operam sob algum efeito da crise.
Desde janeiro de 2021, quando a falta de semicondutores começou a ser repercutida nacionalmente, 6,3 milhões de unidades deixaram de ser produzidas. O problema afeta a montagem de 11,7 milhões de veículos leves ao redor do mundo. Na América do Sul, as perdas desde o começo da crise somam 238 mil veículos.
A situação não é nova para o setor, que sofre para se recuperar dos rombos financeiros causados pela crise do coronavírus. No entanto, mesmo com outros setores econômicos começando a apresentar sinais de melhora, os funcionários do segmento automotivo parecem não ver sinais de recuperação para os próximos meses.
Presidente da Anfavea não vê perspectivas positivas no setor
Segundo o presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), Luiz Carlos Moraes, os próximos trimestres serão ainda de falta de semicondutores e de diversas outras peças, dificuldades logísticas e entraves impostos pela crise econômica nacional.
De acordo com o líder do setor, a pandemia virou o segmento de “pernas para o ar” e as consequências ainda são latentes mesmo dois anos depois do início da crise: “Após um 2020 complicado, 2021 foi muito difícil”, comentou durante uma coletiva de imprensa em dezembro do ano passado.
Para efeito de comparação, em 2020 saíram das montadoras 1,805 milhão de veículos, enquanto em 2021, o total é de 2,038 milhões. Em 2019, antes da Covid-19, esse número chegou a 2,774 milhões.
Pandemia não é a única culpada de crise no setor
Na mesma entrevista citada, Moraes defendeu que a crise já havia afetado o setor antes mesmo do primeiro infectado no Brasil ser anunciado. De acordo com o presidente, quando a doença estava restrita a China, a situação já era um fator de preocupação para o segmento automotivo, devido a produção de insumos chineses.
“Logo em seguida, parou a economia mundial, o tempo foi passando e aí veio o segundo problema, da desorganização da cadeia global: havia poucos navios, contêineres, frete muito alto, lentidão na entrega. As peças começaram a sumir e surgiu um desafio que ninguém esperava nessa proporção, a escassez de semicondutores”, explicou ele na época.
De acordo com Moraes, cada veículo utiliza ao menos mil semicondutores para o bom funcionamento de um carro. No entanto, os carros mais modernos – que se tornaram o sonho de consumo de muitos condutores – podem usar o dobro destas peças, que estão em falta no mercado desde 2020, já que o maior fabricante do planeta, a China, não consegue mais suprir a demanda do mercado.
Crise no mercado brasileiro
Segundo dados divulgados pela Anfavea, pelo menos 300 mil automóveis deixaram de ser fabricados no Brasil em 2021 pela baixa oferta de insumos. Em estimativas simples, esse dado pode chegar a 12 milhões de carros no mundo.
Além deste fato, o que tem atrapalhado a retomada do setor e o seu crescimento é a alta do dólar, que tem tido quedas nas últimas semanas, mas ainda se mantém a patamares altos. Outra questão que pesa na importação é a valorização das commodities, tornando os preços ainda mais elevados do que já eram antes do início da crise.
“Em 2022 continuaremos a ter falhas na logística. A estabilização se dará mais para o fim do ano e início de 2023. Semicondutores continuam sendo um problema que só em 2023 deve ter solução”, finalizou, indicando que não há, ao menos no momento, perspectivas de melhora, ainda apontando que quando essa questão das peças for superada, haverá um outro empecilho: a economia nacional.
“A gente tem uma situação grave no Brasil com o aumento da inflação, a elevação da taxa Selic tem impacto direto nos financiamentos e o PIB [Produto Interno Bruto] já tem revisão para baixo”, explicou Moraes.
Cenário Mundial automotivo
Desde o ano passado, a indústria sofre com o fornecimento de chips, que são essenciais para a produção de placas e circuitos eletrônicos que controlam as funcionalidades dos automóveis.
Com problemas acumulados desde 2020, o cenário automotivo parece longe de melhorar. Em 2021, por exemplo, a Honda anunciou paralisação da linha de montagem em Sumaré, interior de São Paulo. A General Motors também paralisou a sua produção em Gravataí, no Rio Grande do Sul, para aguardar por um estoque de peças. Com isso, o modelo Onix teve as suas vendas afetadas.
Embora marcas como Volkswagen e Mercedes-Benz tenham negado que foram afetadas pela escassez de mão de obra para produzir os seus carros, a Stellantis, marca franco-ítalo-americana, veio à público para alertar que a escassez mundial de produtos no setor automotivo já era uma realidade e que a situação chegou a esse ponto justamente por conta da pandemia.
Falta de peças se deu após a alta venda de eletrônicos
De acordo com representantes da marca, houve um aumento considerável de vendas no setor eletrônico, o que exigiu uma compra maior de chips dos produtores. Com isso, enquanto as empresas de eletrônicos faturavam, as montadoras automotivas tiveram os seus carros encostados nas linhas de montagem, por causa do fechamento das fábricas. Assim, grande parte dos chips foi para o setor de tecnologia, prejudicando o segmento.
Quando o setor automotivo voltou a produzir normalmente após o afrouxamento do lockdown em diversos países, havia escassez dos chips. Nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo, várias fábricas ainda estão com suas linhas paradas em pleno 2022 por falta do insumo.
Embora nem todas as empresas tenham sido afetadas, o desequilíbrio na produção mundial de veículos pode até elevar os preços, devido à velha lei de “oferta versus demanda”, atrapalhando uma guinada do setor automotivo.
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