O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) recua para 0,24% em junho, de acordo com dados divulgados pelo IBGE nesta quarta-feira (10). O número representa uma ligeira desaceleração em relação à taxa de maio, que foi de 0,26%. Ainda assim, o índice veio acima da expectativa do mercado, que projetava alta de 0,23%, segundo o último Relatório Focus.
No acumulado do ano, o IPCA já soma alta de 2,99%, e nos últimos 12 meses, o índice alcança 5,35%. Esse valor extrapola o teto da meta de inflação, que é de 4,5% — considerando a meta central de 3% com margem de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos. A inflação oficial fora do intervalo por seis meses consecutivos** configura descumprimento das metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Energia elétrica lidera pressões sobre o índice
O principal fator de alta em junho foi a energia elétrica residencial, que subiu 2,96%. O avanço está ligado à entrada em vigor da bandeira tarifária vermelha patamar 1, que implica cobrança extra nas contas de luz. A energia foi responsável sozinha por 0,12 ponto percentual do índice total — o maior impacto individual no mês.
No acumulado do ano, a energia elétrica já subiu 6,93%, segundo o IBGE, representando o principal peso individual (0,27 p.p.) na inflação de 2025 até o momento. Essa é a maior variação para um primeiro semestre desde 2018, quando os preços subiram 8,02%. O gerente do IPCA, Fernando Gonçalves, explicou que o item teve trajetória instável ao longo do ano, com bônus no início, mudanças de bandeiras e reajustes regionais.
Alimentos recuam e aliviam a inflação
Em contrapartida, o grupo Alimentação e bebidas apresentou queda de -0,18% em junho, a primeira retração em nove meses. O movimento foi impulsionado pela alimentação no domicílio, que passou de uma variação nula em maio (0,02%) para -0,43% em junho. Produtos como ovo de galinha (-6,58%), arroz (-3,23%) e frutas (-2,22%) ajudaram a puxar os preços para baixo.
Apesar disso, a alimentação fora do lar seguiu em alta, embora com desaceleração: 0,46% em junho, frente a 0,58% em maio. Com esse comportamento, o grupo contribuiu com -0,04 ponto percentual na inflação geral. A redução da inflação nos alimentos também fez cair o índice de difusão (percentual de itens com aumento de preços), que foi de 60% em maio para 54% em junho — o menor patamar desde julho de 2024.
Transportes e serviços voltam a pressionar o índice
Outro grupo que contribuiu para a alta do IPCA foi o de Transportes, que subiu 0,27% em junho, após ter recuado 0,37% em maio. Mesmo com a queda dos combustíveis (-0,42%), houve pressão significativa do transporte por aplicativo, que avançou 13,77%, e do conserto de automóvel, com alta de 1,03%.
No agregado especial de serviços, o IPCA também acelerou, passando de 0,18% em maio para 0,40% em junho. Essa aceleração reflete a alta nos transportes por aplicativo e também na alimentação fora do domicílio, itens com peso relevante no orçamento das famílias. Esses dados reforçam a percepção de que a inflação está sendo sustentada por serviços e preços administrados, dificultando o controle da política monetária.
Monitorados desaceleram, mas impacto persiste
Os preços monitorados pelo governo, como energia elétrica, combustíveis e água, desaceleraram de 0,70% em maio para 0,60% em junho. Ainda assim, permanecem entre os principais vetores inflacionários. A gasolina, por exemplo, registrou queda de -0,34%, enquanto a taxa de água e esgoto teve aumento mais modesto: 0,59% frente aos 0,77% do mês anterior.
Fernando Gonçalves, do IBGE, comentou que, apesar da desaceleração, os preços monitorados continuam pressionando o índice. “A energia elétrica continua influenciando, mas menos do que no mês passado”, observou. Ele também destacou que, se excluíssemos os efeitos da energia e da alimentação do IPCA de junho, o índice seria de 0,36% sem alimentos e 0,13% sem energia, revelando o peso desses componentes.
Desempenho regional: Rio Branco e Campo Grande nos extremos
Entre as regiões pesquisadas, Rio Branco apresentou a maior variação do IPCA em junho (0,64%), impulsionada pelo fim da promoção de meia-entrada em eventos culturais, o que elevou o subitem “cinema, teatro e concertos” em 77,22%, além da alta da energia elétrica na região (3,99%).
Na outra ponta, Campo Grande teve a menor variação, com queda de -0,08%, reflexo principalmente da redução nos preços das frutas (-5,15%) e da gasolina (-1,38%). A análise regional mostra que, embora o IPCA tenha comportamento geral semelhante em todo o país, os fatores locais — como políticas tarifárias e consumo cultural — também exercem influência significativa.
INPC acompanha o IPCA e sobe 0,23% no mês
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que mede a inflação para famílias com renda de 1 a 5 salários mínimos, subiu 0,23% em junho, muito próximo ao IPCA. No ano, o INPC acumula alta de 3,08% e, em 12 meses, de 5,18%, um pouco abaixo dos 5,35% do IPCA.
Assim como no IPCA, os alimentos foram determinantes para o desempenho do INPC. A inflação alimentar passou de 0,26% em maio para -0,19% em junho, dando algum alívio para os consumidores de menor renda. Já os itens não alimentícios mantiveram uma variação de 0,37%, praticamente estável em relação ao mês anterior.
Perspectivas e próximos passos
Com a inflação acumulada em 12 meses acima do teto da meta por seis meses consecutivos, o Banco Central se vê obrigado a explicar os motivos do descumprimento ao Ministério da Fazenda, por meio de uma carta pública. Essa exigência faz parte do regime de metas contínuas que entrou em vigor em 2025.
O próximo IPCA será divulgado no dia 12 de agosto, com foco nos impactos contínuos dos serviços, energia e comportamento dos preços monitorados. A expectativa do mercado será pela sinalização de arrefecimento da inflação, o que poderia abrir espaço para reavaliações na política de juros do Banco Central.
Para Stephan Kautz, economista-chefe da EQI Asset, o IPCA de junho surpreendeu negativamente ao registrar alta de 0,24%, acima tanto da projeção da casa, de 0,18%, quanto do consenso de mercado, de 0,20%.
Apesar disso, ele afirma que a composição do índice não foi ruim. “A principal surpresa veio de alimentação in natura, que é um grupo bastante volátil, e da parte relacionada a transportes por aplicativo, que subiu 14% no mês”, aponta. Segundo ele, esses itens têm pouca ligação com a demanda agregada e com os efeitos diretos da política monetária.
Kautz destaca que os núcleos de inflação e os componentes mais ligados à demanda, como serviços, não mostraram deterioração. “Quando olhamos esses itens, o resultado não veio pior do que nos meses anteriores”, avalia.
Na leitura dele, embora o número cheio tenha vindo acima do esperado, a qualidade da inflação — ou seja, sua composição — foi boa.
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